“A gente sempre encontra encostado num canto de uma casa, um violão que traz muitas histórias. Todo mundo tem um pai ou mãe, tio ou tia, irmão ou irmã, primo ou prima, amigo ou amiga que toca violão, canta uma música. E isso constrói um imaginário, ajuda a tecer relações, afetos, experiências”, reflete o gestor cultural Fernando Chagas, inteirando que é justamente esse universo tão familiar que o “Sons da Cidade - 5ª Mostra Internacional de Violão de Belo Horizonte” busca explorar a partir desta quarta-feira (4 de junho).

“Queremos falar dessa capacidade desse instrumento de transitar no imaginário das pessoas e atravessar suas histórias”, justifica, não sem antes reconhecer: congregando recitais, rodas de conversa, exibição de documentário, exposição fotográfica, concurso para jovens violonistas, lançamento de livro e espaços de convivência, a mostra é tão versátil quanto o próprio instrumento e, até sábado (7), se esmera em ampliar os horizontes de sua experimentação.

Para dar conta dessa missão, o evento recorre a um elenco diverso, cada qual explorando à sua maneira as possibilidades de expressão artística a partir do violão. “Uma característica do ‘Sons da Cidade’ é propor um intercâmbio e um encontro entre artistas locais, nacionais e internacionais”, explica, detalhando que essas conexões formam o norte curatorial da mostra, que, ao mesmo tempo, nunca perde de vista a importância de BH para essa cena: “Minas Gerais e a sua capital são um celeiro de bons violonistas, de maneira que o violão brasileiro deve muito ao Estado, com BH sendo um polo de expressão musical violonística”. 

Alguns nomes, aliás, reforçam essa reverência do evento pela sua cidade-sede. “Caso do Alexandre Gismonti, esse jovem violonista, filho do Egberto, que se tornou um grande expoente do violão e, nascido no Rio de Janeiro, escolheu morar aqui (em Belo Horizonte)”, exalta. O músico participa da abertura do evento com um recital que celebra sua herança musical, que inclui, mas é também anterior ao legado de pai.

“Nessa apresentação, faço um apanhado de repertórios dos meus discos lançados no Brasil (são três, sendo dois deles, ‘Na pressão’ e ‘Baião de domingo’, autorais) e no exterior, além de saudar essa história da música na minha família, que alcança meu bisavô, Antonio, que era italiano, e meu tio-avô, Edgard, que, embora não fossem profissionais, deixaram composições, geralmente homenageando pessoa da família”, comenta, antecipando que, no futuro, ao finalizar essa pesquisa, pensa em transformar esse acervo em um novo projeto.

Encontros 5r2713

Assíduo na mostra desde a sua primeira edição, Alexandre Gismonti exalta o projeto como um espaço de convivência, aprendizado e de troca de experiências. “Quando os artistas vêm para cá, sejam vindos de outros Estados ou de outros países, eles ficam aqui durante todos os dias, participando das rodas de conversa, assistindo aos concertos e tendo a chance de criar conexões novas na música e compartilhar conhecimentos e histórias, que estão sempre por trás do violão”, avalia, acrescentando que, rotineiramente, descobrem nessas interações, mesmo com pessoas vindas de culturas outras, diversos pontos de confluência.

Esse fenômeno, aliás, aparece em outra atividade inaugural da quinta edição da mostra: a roda de conversa entre o Grupo GELA (Guitarras Experimentais Latino-Americanas), dos veteranos Eduardo Campolina, Renato Mendes, Sebastián Barroso e Sérgio Freire, que também se apresentam em um concerto, e o belo-horizontino Thiago Delegado, que se prepara para lançar, ainda neste ano, o sexto álbum da carreira e, no evento, é tratado como “prata da casa”. “É um violonista formidável, criativo, compositor e fomentador do violão em Minas Gerais, reconhecido em todo país”, enaltece Chagas.

Ainda em território mineiro, o evento recebe a jovem Ana Clara Guerra, de Uberlândia, que lançou, no ano ado, seu primeiro álbum, “Novos Ventos”, com composições próprias e obras inéditas de nomes como João Camarero, Alessandro Penezzi e Lucas Telles; e Gustavo Souza, um jovem violonista de BH.

Entre as atrações internacionais, estão as violonistas uruguaias Maria Haro, radicada no Rio de Janeiro, que eia por sonoridades brasileiras, espanholas e latino-americanas, chegando também a interpretar composições do erudito Bach; e Ana Inês Zeballos, que se apresenta, no evento, em parceria com o também uruguaio Edgardo Trigo, formando, juntos, o duo “Latitudes”, cujo repertório inclui músicas de Satie, Baden Powell, Piazzolla e Rosauro.

“São músicos já consagrados em seu país e estão vindo para poder somar nessa curadoria internacional”, reforça Fernando Chagas, lembrando que, fechando o time de artistas de outras nacionalidades, está o argentino Victor Piseta, que realiza um concerto com tangos e peças folclóricas de seus álbuns “La Yumba”, “El día que me quieras” e “Uno”. “É um grande mestre do violão daquele país”, elogia o gestor cultural.

Outras atrações 402r43

Ainda sob a força gravitacional do violão, o “Sons da Cidade” inclui atrações como a exibição do documentário “Violão-canção: Uma Alma Brasileira”, que, com direção de Chico Saraiva e Rose Satiko, fala da criação artística dos compositores e violonistas João Bosco, Marco Pereira, Sérgio Assad, Guinga, Paulo Bellinati, Paulo César Pinheiro e Luiz Tatit. 

“E também recebemos o Celso Faria, que é daqui de BH, para o lançamento, em um recital de violão, do livro ‘José Augusto de Freitas – biografia e álbum de partituras’, que fala sobre esse grande violonista e compositor mineiro”, comenta Fernando Chagas.

“Também vamos ter alguns momentos de convívio, como o ‘Violão com Café’, um espaço de interação onde as pessoas vão lá escutar uma boa música tomando seu cafezinho e comendo pão de queijo – ou seja, com esse jeito mineiro de acolher”, informa, mencionando que os músicos Sílvio Carlos e a Thamiris Cunha estão à frente dessa ação. 

Por fim, o evento apresenta a exposição fotográfica “Sons da Cidade”, que narra, com imagens, a história do projeto, com registros das últimas edições, inclusive as duas realizadas remotamente, durante a pandemia da Covid-19. “É uma forma de celebrar esse feito que nos deixa extremamente felizes, que é conseguir manter esse projeto, de ter essa continuidade”, conclui.

SERVIÇO:
O quê. Sons da Cidade - 5ª Mostra Internacional de Violão de Belo Horizonte
Quando. Abertura nesta quarta-feira (4), às 15h; até sábado (7)
Onde. Conservatório UFMG (avenida Afonso Pena, 1.534, centro)
Quanto. Gratuito. Ingressos para os recitais disponíveis 30 minutos antes, na bilheteria do Conservatório UFMG

*Reportagem atualizada às 10h15 para correção da grafia do nome de Fernando Chagas, um dos realizadores da mostra