EMPREGO

Tem gente formada com salário de ensino médio

Quem tem curso superior tem 2 vezes mais chance de achar emprego, mas remuneração nem sempre é compatível com formação

 

Para quem tem curso superior, o índice de desemprego é duas vezes menor do que para quem tem ensino médio, segundo o IBGE. Em 2024, a desocupação era uma realidade para 3,2% dos que fizeram faculdade. Já para aqueles que estudaram só até o segundo grau, essa taxa sobe para 7,4%. Mas ter um diploma universitário não garante necessariamente um salário condizente ou um cargo compatível com a formação.

De acordo com Isabela Albuquerque, responsável por uma pesquisa da plataforma Geofusion, muitas vezes empresas contratam profissionais com formação superior para ocupar vagas que exigiriam apenas ensino médio, o que acaba por “burlar” os pisos salariais. “Na prática, ocorre um achatamento salarial”, diz a pesquisadora. Ela observa que, independentemente da geração, todos os trabalhadores são afetados pela retração de salários. “Hoje, temos quatro gerações trabalhando ao mesmo tempo, e todas sofrem igualmente com esse problema”, afirma Isabela.

O estudo “O Ensino e o Mercado de Trabalho” analisou os dez cursos que mais formam profissionais no Brasil, cruzando dados do Ministério da Educação (MEC) com informações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) para identificar a empregabilidade de cada área. Por exemplo, em pedagogia, campeão de matrículas, 29% dos formados são contratados como auxiliares de desenvolvimento. Já em direito, 37% dos graduados ocupam cargos de assistente istrativo. Na istração, apenas 3% dos que se formam conseguem trabalhar como es – a maioria acaba atuando como assistente istrativo (52%) ou auxiliar de escritório (18%).

Isabela destaca que essa realidade reduz a remuneração, colocando profissionais com formação superior em posições que pagam muito abaixo do esperado para suas qualificações, com salários entre R$ 1.800 e R$ 2.400. “Significa que, às vezes, a pessoa vai ganhar metade do piso salarial da categoria. Isso pode ser um mecanismo da empresa, que, em vez de contratar o profissional para uma vaga de ensino superior, registra-o em um cargo de ensino médio para pagar um salário menor”, esclarece a pesquisadora.

Competências

O presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH- MG), David Braga, destaca que habilidades como pensamento crítico e capacidade analítica, fortemente estimulados durante a educação superior, são valorizadas no mercado de trabalho. “Quem faz uma faculdade desenvolve minimamente essas habilidades inerentes. Então, vai questionar mais, ter um pensamento crítico mais aguçado, capacidade de análise, gestão de projetos, porque é o que uma faculdade acaba proporcionando. Isso é extremamente valorizado dentro das organizações”, pontua.

Braga ressalta que a qualidade da formação também é crucial. “Muita gente faz uma graduação e não busca uma escola de renome ou minimamente conhecida, porque simplesmente quer um diploma. E aí analisamos que existe o aumento da quantidade de pessoas que estão se formando, mas ter o título não quer dizer que você tem aquele conhecimento de forma consolidada”, diz o especialista, alertando para o fato de que muitos profissionais concluem o curso sem conhecimentos importantes para ocupar um cargo em sua área de formação.

Para o professor Anderson Sant’Ana, da Escola de istração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp), esse cenário é reflexo da transformação digital e das novas formas de organização do trabalho, que exigem cada vez mais competências humanas – as chamadas “soft skills”. “O diploma tem sido, de fato, um fator cada vez mais requerido no contexto de complexidade de competências exigidas dos profissionais, indo além de conhecimentos técnicos. Por exemplo, vendas técnicas e soluções integradas exigem formação de nível superior”, explica.

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