As consequências de uma enchente podem durar muito mais do que se imagina. Um estudo internacional publicado na revista Nature Water revelou que os efeitos na saúde da população exposta a inundações podem persistir por até 210 dias, com aumento significativo no risco de hospitalizações.

A pesquisa analisou 300 milhões de registros hospitalares de 747 comunidades em oito países, incluindo o Brasil, e constatou que a exposição a enchentes está associada a uma elevação nos riscos de internação por diversas causas, incluindo doenças cardiovasculares, diabetes, transtornos mentais e infecções.

Impacto das enchentes na saúde pública

Segundo os dados, o risco relativo (RR) cumulativo de hospitalização por todas as causas após uma enchente foi de 1,26 (IC 95%: 1,15 a 1,38). Para doenças cardiovasculares, o risco subiu para 1,35 (IC 95%: 1,21 a 1,5) e, no caso do diabetes, chegou a 1,61 (IC 95%: 1,39 a 1,86).

Esses efeitos se mantiveram por até 210 dias após a exposição às inundações, com exceções para doenças infecciosas (90 dias) e transtornos mentais (150 dias). A frequência, duração e gravidade das enchentes estão aumentando devido às mudanças climáticas, elevando o alerta para os impactos indiretos na saúde humana.

Populações mais afetadas

O estudo identificou que os efeitos foram mais intensos em áreas com maior densidade populacional e maior status socioeconômico. Mesmo sendo grupos com maior o à saúde, a exposição ambiental agravou a incidência de doenças e a necessidade de hospitalização.

Dados e metodologia

A pesquisa usou registros hospitalares diários de 2000 a 2019 em países como Brasil, Austrália, Canadá, Chile, Nova Zelândia, Taiwan, Tailândia e Vietnã. Foram utilizados modelos de regressão quasi-Poisson com função não linear de defasagem distribuída, seguidos por metanálise de efeitos aleatórios.

O estudo foi conduzido por pesquisadores da Monash University, na Austrália, incluindo os doutores Yuming Guo e Shanshan Li, e contou com participação do brasileiro Dr. Paulo Saldiva, da Universidade de São Paulo (USP).

Recomendações para o sistema de saúde

Os autores alertam que os serviços de saúde devem estar preparados para o aumento da demanda não apenas durante, mas por meses após as enchentes. Isso inclui:

  • Refinamento das estratégias de triagem;
  • Reforço nos estoques de suprimentos médicos;
  • Gestão adequada de equipes e turnos;
  • Monitoramento de grupos de risco, como diabéticos e idosos.

Limitações e alerta para o Brasil

Embora o estudo tenha incluído dados do Brasil, os autores alertam que o conjunto de dados pode subestimar a ocorrência de inundações na América do Sul, já que parte das informações se baseia em eventos reportados por veículos de imprensa. A análise foi feita por comunidade, sem dados de residência exata, o que pode causar variações nos resultados.

Conclusão

O estudo reforça que as enchentes não são apenas eventos de curto prazo. Seus efeitos indiretos na saúde pública são duradouros e devem ser considerados no planejamento urbano, nas estratégias de prevenção e na gestão de crises sanitárias. Com a intensificação dos eventos climáticos extremos, a resiliência do sistema de saúde precisa ser tratada como prioridade.

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