Cristovam Buarque

Educação é a Redenção nacional

Eliminar última trincheira da escravidão: as ‘escolas senzala’

Por Cristovam Buarque
Publicado em 30 de dezembro de 2022 | 05:00

Neste ano, o Brasil pode comemorar a indicação de dois excelentes quadros para o Ministério da Educação. Camilo Santana, como ministro, e Izolda Cela, como secretária Executiva, chegam ao governo Lula com prestígio, graças ao avanço que promoveram nos indicadores da educação de base no Ceará. Os dois dirigentes estão motivados e o momento é favorável para o Brasil dar os para sair da tragédia educacional.

Também em 2022, a Unesco publicou o livro “Reimaginar nossos futuros juntos: um novo contrato social para a educação”, com indicações para o futuro da educação no mundo. Durante quase dois anos, 15 especialistas de países diferentes trabalhamos com o propósito de definir rumos para educação nas próximas décadas, levando em conta a necessidade de universalização, uso das modernas ferramentas de tecnologia educacional e a equidade.

Recuperar e melhorar o sistema educacional

A tarefa mais urgente no MEC é recuperar o desastre da triste coincidência histórica da Covid-19 e do bolsonarismo: escolas depredadas e fechadas, professores e alunos evadidos, atraso na formação. A segunda urgência é melhorar o sistema educacional brasileiro degradado e adotar boas práticas em todos os Estados e municípios. As epidemias, sanitária e política, destruíram o que já não tinha qualidade, como um terremoto em povoado de casebres.

As práticas no Ceará, e em outros Estados e municípios, assim como o trabalho de organizações não governamentais, do tipo Todos pela Educação, Fundação Lehmann, Fundação Bradesco, Instituto Ayrton Senna, ajudaram a educação brasileira a evoluir, em relação ao ado, mas ainda nos deixando atrás, ao nos compararmos com o resto do mundo, e desigual, conforme a renda da família.

Abolição e Redenção

Foi no Ceará que, em 1884, se iniciou a Abolição da escravatura no município hoje chamado Redenção. Seria bom que, em 2023, novos cearenses adotassem a ambição de seus conterrâneos do ado e liderassem a eliminação da última trincheira da escravidão que amarra o progresso e envergonha o Brasil: a divisão do sistema escolar entre “escolas casa grande”, para a “minoria descendente social” dos escravocratas, e “escolas senzala” para a “maioria descendente social” dos escravos.

Para tanto, o MEC não pode continuar se dedicando quase exclusivamente a financiar o ensino superior e deve assumir a responsabilidade pela educação de nossas crianças, hoje nas mãos dos municípios, pobres e desiguais. Além disso, o ministério deve definir estratégia para a implantação de um Sistema Público Nacional de Educação de Base e executar um programa para a erradicação do analfabetismo.

Estas tarefas não serão cumpridas pelos municípios e estados. Tanto quanto, a Abolição não pôde esperar pela vontade de cada município que desejasse copiar o feito de Redenção. A redenção precisa ser nacional.