O STF e o julgamento de Bolsonaro
Considerações sobre a decisão da Primeira Turma
A decisão da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal em relação ao ex-presidente Jair Bolsonaro de aceitar a denúncia da PGR e torná-lo réu, entendendo que houve uma tentativa de golpe de Estado com base no que foi, fundamentalmente, encontrado no celular do coronel Mauro Cid e em sua delação premiada, merece algumas breves considerações.
Trata-se de uma mudança na jurisprudência do Supremo, pois, no caso da Lava Jato, apesar do prejuízo de bilhões causado ao Brasil por corruptores confessos, a Suprema Corte não utilizou a delação premiada como fundamento de suas decisões e até entendeu que ela não poderia servir para embasar prisões.
Como um velho advogado, com 68 anos de exercício profissional e 61 de magistério universitário, confesso que ainda tenho muitas dificuldades para compreender a decisão, sem, contudo, fazer qualquer crítica aos ministros. Aliás, por não criticá-los e, muitas vezes, elogiá-los, sou frequentemente censurado por meus leitores e seguidores das redes sociais.
Fato é que, primeiro, para haver uma tentativa de golpe, seria necessária uma ação concreta, que só poderia ser realizada por militares. No entanto, nenhum militar com comando de tropas saiu às ruas para essa tentativa.
Lecionei durante 33 anos para coronéis que seriam promovidos a generais e, em 2022, creio que aproximadamente 90% dos generais haviam assistido às minhas aulas de direito constitucional. Lembro-me perfeitamente de que, durante as aulas, nos momentos de debate, não havia ambiente para que algum deles cogitasse golpes de Estado, até porque minhas aulas eram sobre o respeito à Constituição, jamais sobre sua ruptura.
Em segundo lugar, afirmar que o evento de 8 de janeiro de 2023 foi um golpe é algo muito difícil de aceitar.
Ninguém estava armado. Foi uma baderna, mas não foi um golpe de Estado. Uma das participantes estava com batom e alguns tinham estilingues.
Ora, com batom e estilingues não se faz uma revolução, mas com tanques, canhões e espingardas.
O terceiro elemento que me impressiona é chamar de documento golpista um papel sem , em que constava uma declaração de estado de sítio.
Ora, o estado de sítio é uma figura constitucional que existe para garantir o Estado de direito, e não para rompê-lo. Para ser decretado pelo presidente, o estado de sítio deve ser autorizado por maioria absoluta do Congresso Nacional.
Quarto ponto: os brilhantes advogados de defesa não tiveram o completo à delação premiada e a todos documentos. A Constituição, no inciso LV do artigo 5º prevê a garantia da “ampla defesa”. A palavra “ampla” é um adjetivo de uma força ôntica impressionante.
Com todo o imenso respeito que tenho aos ministros, a matéria teria, a meu ver, que ser decidida pelo plenário da Suprema Corte, dada a importância da discussão.