Ainda sobre o semipresidencialismo
Exemplos de aplicação e seus obstáculos
Diante das crescentes dificuldades de todos os presidentes da República brasileiros em conquistar maioria parlamentar para implantar seus programas de governo, nas últimas duas décadas, os deputados Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR) e Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) apresentaram a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 2/2025 propondo a adoção no país do chamado “sistema semipresidencialista”.
Os regimes democráticos tinham seus sistemas de governo classificados como parlamentarista ou presidencialista. O presidencialismo está presente, por exemplo, nos EUA, no México e em toda a América Latina. Já o parlamentarismo convive com formas de governo combinadas com monarquias constitucionais (Reino Unido, Espanha, Canadá, Holanda, Bélgica, Suécia, Noruega) ou a república, sendo o chefe de Estado o seu presidente (Portugal, Alemanha, Itália, Grécia). O semipresidencialismo seria uma mescla do presidencialismo com o parlamentarismo, com o presidente da República tendo poderes maiores que os do chefe de Estado com funções decorativas ou restritas à defesa nacional e à diplomacia.
Os exemplos de semipresidencialismo classicamente citados são França e Portugal. Acontece que os portugueses, diferentemente dos ses, consideram seu sistema parlamentarista. É verdade que o presidente, eleito por voto direto, tem presença muito mais forte do que os monarcas constitucionais (nomear e demitir o primeiro-ministro e, por sugestão dele, o Conselho de Ministros; vetar iniciativas legais do parlamento ou arguir à Corte constitucional sua legalidade; convocar referendos; dissolver o parlamento; pautar assuntos relevantes no parlamento).
Já os ses consideram seu sistema semipresidencialista, estabelecido, em 1958, por Charles de Gaulle, substituindo o regime parlamentar da Quarta República. Em resumo, todos sabem o nome de Emmanuel Macron, e ninguém lembra os dos primeiros-ministros ses. O presidente francês é muito forte.
Pela PEC 2/2024 o presidente da República continuaria sendo eleito diretamente e dividindo as tarefas de governo com o primeiro-ministro, nomeado por ele, ouvido o Congresso Nacional. Continuaria liderando as Forças Armadas e a diplomacia brasileira e teria ainda a capacidade de propor e vetar leis. O presidente teria poder de dissolver o Congresso e convocar novas eleições, nas circunstâncias previstas. O primeiro-ministro permaneceria no cargo enquanto tivesse apoio parlamentar para governar e lideraria o Conselho de Ministros nas tarefas executivas.
Eu, que sou parlamentarista, acho a proposta um grande avanço. Quais os problemas? Primeiro o nome no país do jeitinho brasileiro. Tudo que é “semi” não é inteiro, a a ideia de acochambramento, de meia solução. Talvez fosse melhor assumir a denominação de parlamentarismo à portuguesa ou algo como “presidencialismo compartilhado”. O “semi” funciona na França, aqui não.
Outro obstáculo: misturar a discussão de sistema de governo com a do sistema eleitoral. Fui autor da PEC do distrital misto na reforma de 2015 e não conseguimos nem um terço do apoio necessário. De lá para cá, só piorou. Infelizmente, os parlamentares não querem nem a territorialização do voto (França), nem a lista partidária (Portugal)