e mais publicações de Marcus Pestana

Marcus Pestana

Marcus Pestana é ex-deputado e diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI)

MARCUS PESTANA

Seria o fim completo do liberalismo?

A política errática de Donald Trump para o mundo

Por Marcus Pestana
Publicado em 15 de março de 2025 | 07:00

Não se fala de outra coisa. Donald Trump é o assunto diário do momento. Nada mais gratificante para um líder famoso dos “engenheiros do caos”. Não importam verdade e mentira, consequências e danos, resistências e críticas. Desde que a imagem que se deseja construir seja fortalecida e a voracidade da bolha de seus seguidores devidamente abastecida e mobilizada, tudo se justifica. Valem bravatas estapafúrdias de péssimo gosto como a de transformar a Faixa de Gaza em resort ou ameaçar tomar a Groenlândia e o Canal do Panamá. As tarifas de importação viraram ferramenta de chantagem.

A ideia de democracia é substituída por um governo movido a decretos, o que parece não incomodar a maioria republicana na Câmara dos Representantes e no Senado. E pela criação da imagem de um presidente plenipotenciário, onipresente e superpoderoso. Um verdadeiro xerife do mundo contemporâneo. Na mesa, só duas opções: aderir ou receber a ira do neoimperialismo americano.

É ainda uma fase de acomodações. Na análise de líderes populistas iliberais que abusam de factoides exóticos e até de fake news, a atenção tem que estar concentrada nas ações concretas, e não na retórica. Afinal, tarifas foram impostas e canceladas em 24 horas. Medidas sabidamente (inclusive por Trump) inconstitucionais foram revertidas na Justiça ou contraditadas por iniciativa de governadores de Estados americanos.</CW>

Por outro lado, os EUA, apesar de serem a maior economia do mundo, não têm mais hegemonia absoluta e capacidade unilateral de dar as cartas. E, ainda, determinadas medidas podem transformar-se em tremendo tiro no pé com a volta do cipó da aroeira da inflação, dos juros altos, da perda de competitividade e da queda do valor dos ativos americanos no lombo de quem mandou dar.

Ao final do século XX, encaramos uma realidade configurada pelo desmoronamento do socialismo real e pelo estrangulamento fiscal do Estado de bem-estar social-democrata A globalização avançava, a hegemonia do liberalismo econômico e político parecia definitiva, e a história teria encontrado o seu “fim”. O multilateralismo e a necessidade de uma governança global pareciam imperativos. Se bem que, no mundo da globalização avançada, o trânsito era livre para mercadorias e capitais, não para a força de trabalho.

A imigração em massa de populações pobres africanas, asiáticas e latino-americanas geraram resistências enormes, caldo de cultura propício para o surgimento de uma extrema direita selvagem. A sociedade assiste à fragmentação de interesses e à polarização ideológica crescentes. Os partidos políticos perdem força e enfrentam a substituição parcial de seu papel pela participação direta individual ou em grupos nas crescentemente poderosas redes sociais.

Donald Trump, nestes dois meses, acionou sua metralhadora giratória contra tudo e todos. Não escaparam Canadá, México, Colômbia, Ucrânia, Brasil, China, Irã, Palestina. Tudo em nome do “America First”. As instituições multilaterais simbólicas do mundo pós-guerra foram confrontadas: OMS, OMC, Acordo de Paris, OTAN etc. Aonde chegaremos? Será o fim do liberalismo?

Muitos que apoiaram Trump já revelaram seus temores e pam as barbas de molho. Só o tempo poderá dizer até onde irão as estripulias e a ousadia trumpistas. Só o tempo revelará completamente suas consequências.