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Julgamento de Londres acelera busca por repactuação de Mariana
Eventual condenação de BHP Billiton na Inglaterra pressiona mineradoras a tentar amenizar sentença e Poder Público, a evitar que acordo no Brasil perca fôlego

Previsto para a próxima segunda-feira (21 de outubro), o início do julgamento de responsabilização da BHP Billiton em Londres, na Inglaterra, acelerou a busca por um denominador comum para repactuar o acordo de reparação sócio-econômica pelo rompimento da barragem de Mariana, em 2015. Após cerca de nove anos da tragédia, a repactuação, que, iniciada ainda em 2021, atravessa os governos Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), depende apenas de detalhes considerados marginais.
Além do Palácio do Planalto, o acordo, que é mediado pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), envolve, de um lado, os governos Romeu Zema (Novo) e Renato Casagrande (PSB), os Ministérios Públicos de Minas Gerais e do Espírito Santo e o Ministério Público Federal. De outro, estão a BHP e a Vale, sócias na Samarco, uma t venture, ou seja, uma sociedade de propósitos específicos, criada para minerar na Bacia do Rio Doce.
Interlocutores das negociações disseram a O TEMPO que a pressa por concluir o acordo até o fim de outubro é provocada pelo julgamento da BHP. Enquanto os governos Zema, Casagrande e Lula estariam temendo que uma eventual condenação da mineradora anglo-australiana tire o ímpeto por um acordo no Brasil, a BHP e a Vale estariam apostando que uma repactuação bem-sucedida poderia amenizar uma eventual condenação na Justiça britânica.
A BHP é a única ré na ação cível apresentada à Corte por cerca de 600 mil vítimas do rompimento da barragem, 23 mil quilombolas e indígenas Krenak, Tupiniquim, Pataxó e Guarani, 46 municípios e, aproximadamente, 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas. Em 2023, a Vale chegou a ser incluída como ré a pedido da própria BHP, mas, após acordo entre as sócias, a multinacional brasileira foi retirada, sob o compromisso de pagar 50% das indenizações de uma potencial responsabilização. As vítimas pedem R$ 230 bilhões.
Apesar de o julgamento ser em Londres, onde a BHP tem domicílio, a base legal é a legislação brasileira, como a Política Nacional do Meio Ambiente, o Código Civil e a Lei das S.A.. O escritório de advocacia Pogust Goodhead, que defende as vítimas, acusa a multinacional de, entre outras coisas, ser responsável por poluição, pelo colapso da barragem do Fundão, objetiva e subjetivamente, por ação ou omissão voluntária, e pelos danos causados enquanto acionista controladora da Samarco.
A porta-voz do escritório, Ana Carolina Salomão, afirmou, nesta terça (15 de outubro), em um seminário com jornalistas, que o andamento da repactuação não impacta o julgamento de Londres. “Os dois processos são distintos. A repactuação tem como agentes negociadores a BHP e a Vale, os Estados de Minas Gerais e Espírito Santo e a União. (...) O processo da Inglaterra tem como centro os indivíduos, os indígenas, os quilombolas e os municípios de fato atingidos pelo desastre”, pontuou Ana Carolina.
Apesar de o julgamento estar previsto para se iniciar na próxima segunda, a expectativa é que ele se arraste ao menos até maio de 2025, dois meses depois das alegações finais dos autores do processo e da BHP Billiton. Entre o início e o fim do julgamento, a Justiça britânica ficará de recesso entre 20 de dezembro e 13 de janeiro de 2025. Como o procurador geral de Justiça de Minas Gerais, Jarbas Soares Júnior frisou na última segunda, a expectativa em torno da reparação é por uma solução até o dia 29 de outubro.
Partes ainda discutem valor de indenização para Mariana
Um dos pontos ainda em discussão entre as partes é a indenização que ficará a cargo de Mariana, que, como principal atingida pelo rompimento da barragem do Fundão, terá compensações específicas. A indenização inclui, por exemplo, o reassentamento do distrito de Bento Rodrigues e a descaracterização do dique S4. Autorizada pelo então governador Fernando Pimentel (PT), a estrutura foi construída para conter o escoamento dos rejeitos e seria temporária.
Aproximadamente 40 municípios de Minas e do Espírito Santo, considerados pela Justiça como diretamente atingidos pelo rompimento da barragem, devem fazer parte do acordo, como Ouro Preto, região Central, a 12 quilômetros de Mariana, e Ponte Nova, Zona da Mata, a 70 quilômetros da cidade. Ao contrário do acordo de reparação do rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, em 2019, a repactuação de Mariana não deve incluir outros municípios além dos atingidos.
Os termos até agora costurados entre o governo Lula, os governos Zema e Casagrande, a Vale e a BHP Billiton preveem uma indenização de cerca de R$ 137 bilhões. Do total, R$ 37 bilhões já foram investidos pela Fundação Renova, que já chegou a ter a extinção pedida pelo Ministério Público de Minas Gerais, e R$ 100 bilhões, divididos entre recursos para os Estados e ações feitas pela Samarco. O valor foi apresentado como contraproposta pelo Poder Público às empresas no último mês de junho.
Procurada, a Vale frisou que as tratativas ocorrem “exclusivamente no âmbito do processo de mediação, de acordo e em observância aos princípios norteadores desse tipo de método de solução de conflitos”. “A Vale, como uma das acionistas da Samarco, segue engajada no processo de mediação conduzido pelo TRF-6 e busca, junto às autoridades envolvidas, estabelecer um acordo que garanta a reparação justa e integral às pessoas atingidas e ao meio ambiente”, informou a mineradora.
A exemplo da Vale, o TRF-6 afirmou que, “em razão do princípio da confidencialidade, nenhuma informação pode ser reada neste momento”. “As tratativas de repactuação ainda estão em andamento”, pontuou a Corte. Os governos Zema e Casagrande e o governo Lula foram procurados, mas, até a publicação desta reportagem, não responderam. Tão logo se manifestem, o posicionamento será acrescentado. Por outro lado, a reportagem não conseguiu contato com a BHP Billiton.
Errata: ao contrário do que informou inicialmente a reportagem, o valor da indenização cobrada pelas vítimas na Justiça britânica não é R$ 46,7 bilhões. O número é R$ 230 bilhões. A informação foi corrigida nesta segunda-feira (21 de outubro), às 15h46.