BRASÍLIA – Marido da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), o coronel Aginaldo Oliveira (PL), pediu afastamento temporário do cargo de secretário de Segurança Pública de Caucaia, no Ceará, em 21 de maio. A justificativa foi a de doença de um parente. Duas semanas depois, a esposa dele anunciou que o casal havia deixado o Brasil. Ela é considerada foragida da Justiça brasileira.

Conforme publicação do Diário Oficial do município, Aginaldo ficaria fora até 30 de maio. O secretário adjunto, Marcos Antonio Jesus, foi nomeado em seu lugar. Não há informação sobre qual parente do coronel está com problemas de saúde. Em live na terça-feira (3), quando anunciou estar fora do país, Zambelli diz “buscar tratamento médico”.

Em resposta ao O TEMPO, a Prefeitura de Caucaia informou, em nota, que Aginaldo Oliveira formalizou um novo pedido de licença para “acompanhar um familiar em tratamento de saúde”. Nesse novo pedido, ele disse que retorna ao cargo em 1º de julho.

Coronel da Polícia Militar do Ceará, Aginaldo concorreu à Prefeitura de Caucaia em 2024, quando ficou em quarto e último lugar, com 12,26% dos votos. Aginaldo comandou a Força Nacional no governo de Jair Bolsonaro. Em 2021, ele teve o hoje senador Sergio Moro, então ministro da Justiça de Bolsonaro, como padrinho em seu casamento com Zambelli.

Com 44 anos, Zambelli hoje demonstra fragilidade, comportamento distinto daquele dos tempos de militância e dos primeiros quatro anos de mandato. Diz que não “sobreviveria” à cadeia. Alega problemas de saúde. Por isso pedirá prisão domiciliar, caso não consiga reverter a sentença do STF.

Zambelli afirma ainda que já foi internada duas vezes, enfrenta depressão e problemas cardíacos, desmaios e uma síndrome rara, chamada Ehlers-Danlos, que faz “todo o corpo sair do lugar” e causa transtornos de mobilidade.

Moraes manda prender Zambelli, cassar aporte e bloquear bens da deputada t2b18

Nesta quarta-feira (4), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decretou a prisão preventiva de Zambelli. A decisão atendeu a um pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR).

Moraes afirma na decisão que a deputada tentou “se furtar da aplicação da lei penal”. O ministro também mandou bloquear os aportes de Zambelli e incluir o nome dela na lista de difusão vermelha da Interpol.

Zambelli foi condenada pela Primeira Turma do STF a 10 anos de prisão, em regime inicial fechado, e à perda do mandato pela invasão hacker aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). 

A deputada também responde a um processo criminal no Supremo por perseguir um homem com uma pistola na véspera da votação do segundo turno das eleições de 2022.

Zambelli arrecadou ao menos R$ 285 mil em ‘vaquinha’ dizendo que era para pagar multas 193b3v

Carla Zambelli recebeu ao menos R$ 285 mil de apoiadores, via Pix, antes de deixar o Brasil. A parlamentar dizia que a “vaquinha” virtual, organizada por ela mesma, visava pagar multas decorrentes de decisões do STF. Agora, o dinheiro deve ser usado em sua estada na Europa.

Zambelli deu início à campanha de arrecadação em 19 de maio. No mesmo dia, ela publicou um extrato bancário com saldo de R$ 166 mil e disse que sua conta estava com R$ 14 mil negativos antes do início da arrecadação. Já em 21 de maio, a deputada anunciou que estava com R$ 285 mil em sua conta.

“Conseguimos arrecadar R$ 285 mil nesta campanha tão necessária para o pagamento das multas injustas e completamente desproporcionais, impostas por uma perseguição implacável mas que também não me fará recuar”, afirmou Zambelli em rede social.

No entanto, na última terça, ela anunciou, em uma live no Youtube, que havia deixado o Brasil no fim de semana para se fixar na Europa, e que vai pedir o afastamento de seu mandato na Câmara, seguindo o exemplo do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos EUA.

Zambelli afirmou na live que estava na Europa havia alguns dias, mas o marido da deputada afirmou, em entrevista à CNN Brasil, que ambos estavam nos Estados Unidos. Até a manhã desta quarta-feira, era incerto o paradeiro do casal. Não há registro da saída deles do Brasil.

Também à CNN, depois da participação na live no Youtube, Zambelli disse que deve morar na Itália, país do qual possui cidadania, o que, de acordo com ela, impediria uma eventual deportação para o Brasil. Por isso, segundo ela, vai se tornar “intocável”.

“Tenho cidadania italiana e nunca escondi, se tivesse alguma intenção de fugir eu teria escondido esse aporte. [...] Como cidadã italiana, sou intocável na Itália, não há o que ele possa fazer para me extraditar de um país onde eu sou cidadã, então estou muito tranquila quanto a isso”, disse.

Mesmo após deixar o Brasil, Zambelli continua pedindo Pix nas redes sociais. Ela ainda colocou os dados bancários na descrição de seus perfis. Também reou a istração de suas redes sociais para sua mãe, Rita Zambelli.

“Tomei a decisão de transferir oficialmente a titularidade das minhas redes sociais, como herança, para minha mãe, Rita Zambelli, uma mulher íntegra, de princípios sólidos, que carrega os mesmos valores que sempre defendi”, disse a deputada.

Zambelli ainda prosseguiu afirmando que sua mãe é também sua “pré-candidata a deputada federal no próximo ano, justamente para dar continuidade a essa luta que é de toda a nossa família e de milhões de brasileiros que se recusam a se curvar diante do autoritarismo”.

Após Zambelli anunciar que saiu do Brasil, o advogado Daniel Bialski anunciou ter deixado a defesa da deputada. ele legou “foro íntimo”. Disse que, a partir de então, quem se pronunciaria sobre a deputada era a assessoria de imprensa dela, que, por sua vez, não havia emitido qualquer nota.

Também na terça, depois de Zambelli comunicar a saída do país, a PGR pediu a prisão preventiva da deputada. O procurador-geral da República, Paulo Gonet, argumenta na solicitação que a prisão é necessária para “assegurar a devida aplicação da lei penal”, pois a condenação pela invasão hacker aos sistemas do CNJ só não começou a ser cumprida porque há recursos pendentes. Moraes atendeu o pedido de Gonet.

Zambelli não teve aporte confiscado nem perdeu redes sociais 2c1m5n

Apesar de falar em perseguição e perda de direitos no Brasil, mesmo condenada à prisão, Zambelli não teve o aporte apreendido nem ficou impedida de deixar o Brasil. Por isso, viajou no fim de semana legalmente.

Ao condenarem Zambelli à prisão, os ministros da Primeira Turma do STF declararam a perda automática do mandato da deputada. No entanto, Zambelli não perdeu o cargo automaticamente.

A perda da função de deputada só pode ser concretizada pela Câmara dos Deputados, conforme prevê a Constituição. O que já está valendo é a inelegibilidade da parlamentar por oito anos.

Zambelli também ainda pode apresentar embargos de declaração após a publicação do acórdão à decisão da Primeira Turma do STF. O recurso não tem poder de alterar a condenação, mas adia o trânsito em julgado do processo. Eventual prisão da parlamentar também precisa ser autorizada pela Câmara.

Contudo, a jurisprudência do STF é a de que se a pena for superior a 120 dias de prisão em regime fechado (o que é o caso), o próprio tribunal pode determinar a medida porque a Constituição prevê que o deputado perderá o mandato se faltar a um terço das sessões. Neste caso, cabe à Mesa Diretora da Câmara apenas declarar a perda de mandato.

O STF sentenciou Zambelli a cumprir pena em regime fechado pela invasão aos sistemas do CNJ. A decisão também atinge o hacker Walter Delgatti Neto, condenado a 8 anos e 3 meses de prisão.

Ele confessou ter inserido documentos falsos no sistema. Entre eles um mandado de prisão contra Alexandre de Moraes – o documento tinha do próprio ministro. Disse ter sido contratado por Zambelli, que confirmou a relação com o hacker, mas negou cometimento de crimes.

Perseguição com arma em São Paulo e cassação 5j2s52

Recentemente, Zambelli reclamou do abandono de Jair Bolsonaro. O episódio que levou ao “abandono” de Bolsonaro e aliados, segundo a própria deputada, ocorreu em 29 de outubro de 2022, um dia antes da votação do segundo turno das eleições presidenciais. Após discutir com eleitores em uma rua no bairro dos Jardins, em São Paulo, Zambelli, que já estava reeleita, perseguiu um deles, apontando uma arma de fogo.

Zambelli alegou ter sido agredida fisicamente, acusando seus opositores de usarem “um homem negro para vir em cima de mim”. No entanto, a alegação foi desmentida com a divulgação de vídeos que mostram o momento em que ela discute com os eleitores, tropeça sozinha e, armada, persegue um dos homens, acompanhada de seguranças pessoais dela.

Em áudio, ouve-se o homem desarmado implorando pela vida. A legislação eleitoral proíbe o transporte de armas e munições, configurando porte ilegal de arma, na véspera de uma votação. O caso foi parar no STF, que em março de 2025 formou maioria de votos para condenar a deputada a cinco anos e três meses de prisão pelos crimes de porte ilegal de arma de fogo e constrangimento ilegal.

A maioria da Corte também se posicionou a favor da cassação do mandato dela. O julgamento foi suspenso por 90 dias devido a um pedido de vista do ministro Nunes Marques. Em meio a isso, Bolsonaro externou o que já falava reservadamente. Em entrevista, ele disse que Zambelli “tirou o mandato” de sua chapa nas eleições de 2022 após este episódio. Por isso, se afastou dela. Assim como os mais fiéis aliados de Bolsonaro.

Um dia após ser apontada pelo ex-presidente como responsável pela derrota dele, Zambelli fez um desabafo nas redes sociais. Sem mencionar nominalmente Bolsonaro, ela afirmou ser “difícil aguentar o julgamento” de quem sempre defendeu. “Enfrentar o julgamento dos inimigos é até ável. Difícil é aguentar o julgamento das pessoas que sempre defendi e continuarei defendendo”, escreveu a parlamentar.

Em uma entrevista para o jornal Folha de S. Paulo, ela afirmou que se sentia abandonada por Bolsonaro. “Desde 2013 eu apoio o Bolsonaro. Antes como ativista, nas causas dele, ajudei na eleição de 2018. Durante todo o governo. Acho que eu fui uma das pessoas mais na linha de frente dentro do Congresso para poder defender o governo, o presidente”, disse ao jornal paulista.

Em 14 de maio, Zambelli sofreu a maior derrota, com a condenação a 10 anos de prisão por invasão do sistema do CNJ e falsificação de identidade. O PL emitiu uma nota em apoio à deputada, mas os políticos mais proeminentes da sigla permaneceram em silêncio, repetindo o que ocorreu com ex-aliados, como Gustavo Bebianno, Sara Giromini, Daniel Silveira, Roberto Jefferson, Alexandre Frota, Joice Hasselmann e Abraham Weintraub.

Inelegibilidade e condenações por ataques ao TSE e Lula 2f2o4c

Carla Zambelli conseguiu ser reeleita em 2022, com 946.244 votos. Mas ela acumula pelo menos quatro condenações por fake news contra adversários políticos e o sistema eleitoral brasileiro. Principalmente naquele período eleitoral, o que pode lhe custar seu mandato.

Em dezembro de 2024, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) acatou uma ação movida pela deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP) contra Zambelli por fake news contra o processo eleitoral. Em janeiro de 2025, o TRE-SP cassou os direitos políticos de Zambelli por 8 anos.

Antes disso, em setembro de 2023, Zambelli, Mara Gabrilli e Flávio Bolsonaro foram condenados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) a pagar R$ 10 mil a Lula por espalhar mentira que o petista pagou para não ser relacionado ao assassinato do ex-prefeito de Santo André (SP) Celso Daniel (PT).

No dia 25 do mesmo mês, Zambelli foi multada em R$ 30 mil por divulgar a notícia falsa sobre a manipulação de urnas eletrônicas, publicada nas redes sociais durante a campanha eleitoral de 2022. Já em 20 de fevereiro de 2024, o TSE multou Zambelli em R$ 30 mil por propagação de desinformação contra o então candidato Lula em 2022.

Agora, enquanto diz buscar forças para enfrentar as decisões judiciais, além dos recursos que serão apresentados à Justiça, Zambelli afirma ter outro trunfo: a Câmara. Diz que o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), deu “sinal verde” ao líder do PL, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), para apresentar pedido de suspensão da ação penal contra ela no caso da invasão ao sistema do CNJ. Além dos 10 anos de prisão, o STF impôs à deputada e ao hacker uma indenização de R$ 2 milhões por danos morais e coletivos.