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Emanuele Cappellano lidera nova era da Stellantis na América do Sul
Emanuele Cappellano é o primeiro entrevistado da Temporada Minas S/A Mercados.
Emanuele Cappellano, 49, presidente da Stellantis para a América do Sul, é o primeiro entrevistado da temporada Minas S/A Mercados em todas as plataformas de O TEMPO até abril.
A Stellantis – união da Fiat Chrysler e Peugeot Citroën – é a quarta maior fabricante de automóveis do mundo.
No Brasil são três fábricas: em Betim (MG), onde também fica a sede da montadora na América do Sul; em Goiana (PE), e em Porto Real (RJ).
Cappellano vai comandar um novo ciclo de investimentos da montadora, de R$ 32 bilhões, no período de 2025 a 2030 para a América do Sul.
No Brasil serão R$ 30 bilhões.
Cappellano nasceu em Riet, na Itália, é economista, ingressou na Stellantis em 2002 e chegou ao Brasil com a família em 2014.
Assumiu o comando da Stellantis na América do Sul em novembro de 2023 e tem mantido a liderança de mercado da montadora, além de comandar a nova era tecnológica na companhia.
A seguir, a entrevista de Emanuele Cappellano na íntegra:
HL: Cappellano, eu queria que você começasse falando sobre a sua trajetória. Você nasceu em Rieti, eu estava pesquisando e é uma cidade com um pouco mais de 45 mil habitantes, há 70 quilômetros de Roma… seu pai foi oficial da Marinha, como foi essa sua trajetória até chegar a essa paixão pelos carros?
EC: Rieti é uma cidade pequena, próxima a Roma, mas a verdade é que eu nunca morei lá. Eu só nasci, porque a minha mãe era de Rieti, e a verdade é que por causa do trabalho do meu pai eu sempre viajei muito na Itália, às vezes viajei no exterior, então tive essa experiência, eu cresci mudando para várias cidades. Foi uma experiência que demorou até os 15 anos, mais ou menos, e depois com 15 anos eu decidi sair de casa, ir para uma Escola Militar. Me formei na Escola Militar, no Ensino Superior, continuei estudando em Veneza, que não tem carros.
HL: É, não pode andar de carro.
EC: Zero, zero. (risos) Eu me formei em Veneza, em Economia, e logo depois eu decidi tentar uma experiência em uma empresa multinacional. Eu tinha uma paixão pelos grupos internacionais, os expatriados que moram em outros países, em compartilhar esse tipo de experiência. De fato, eu tive a oportunidade de entrar recém-formado na Fiat, em Turim, naquela época foi em 2002, e foi uma paixão que brotou e nunca de fato me deixou. Desde então, eu cresci em Turim profissionalmente por muitos anos no mundo automotivo, especialmente na área de finanças, e em 2014 veio o Brasil, aqui em Minas Gerais exatamente. Se aram 10 anos, na época eu venho para o Brasil com a ideia de ficar 2 anos e agora já se aram 10 anos, fico muito feliz em Minas Gerais e no Brasil.
HL: E vai continuar, né? Você assumiu a liderança da Stellantis para a América do Sul em novembro de 2023, quer dizer, tem essa relação muito forte aqui com Minas, por ter chegado e ter vindo para o Polo Automotivo da Stellantis em Betim/MG, com a sua família, com a Valentina e com os filhos, Andrea e Lorenzo, né?
EC: É mesmo, é um laço que é um pouco pessoal, um pouco do trabalho. Quando falo de pessoal, de fato quando a minha família veio aqui para o Brasil nós tínhamos, eu e minha esposa italiana também, nós viemos com 2 meninos, o mais novo tinha 3 meses, não nasceu em Minas Gerais, mas tinha 3 meses, e o mais velho 2 anos. De fato, meus filhos são mineiros pela educação, pela cultura, pela experiência, e Minas Gerais, o Brasil é um país extremamente acolhedor. Então, tiveram também experiências, por exemplo, de ficar nos Estados Unidos, em outros países, e a verdade é que se adaptar ao Brasil, ter a experiência de vida no Brasil é muito fácil, é uma vivência e uma proximidade muito boa, os mineiros têm um coração grande.
HL: É uma paixão, é incrível! Você até teve experiência em outras empresas, chegou a sair um período, mas falou mais forte, né?
EC: Exato. Há alguns anos eu fui para a América do Norte, fui para Nova Iorque em um outro setor, mas, de fato, após pouco menos de 2 anos decidi voltar, surgiu uma grande oportunidade e eu voltei, porque estava faltando exatamente essa paixão pela equipe de trabalho da Stellantis da América do Sul, pela experiência e pelo desafio de trabalhar na Indústria Automotiva, que é uma indústria extremamente desafiadora, mas cheia de satisfações. Então, foi uma decisão fácil também voltar.
HL: Que bom! Aí agora você vai comandar o maior investimento da história da Stellantis, R$ 32 bilhões só para a América do Sul, e a operação mundial da Stellantis tem uma confiança na América do Sul, no potencial dela como o terceiro motor praticamente para alavancar cada vez mais as vendas. Quando você olha nesse escopo esses R$ 32 bilhões divididos nas fábricas, qual é o entendimento daqui para frente para levar nesse próximo ciclo até 2030?
EC: Hoje, a América do Sul, o Brasil em particular, está vivendo um momento de transição tecnológica, toda a indústria está vivendo um momento de transição tecnológica. A descarbonização é um treino, talvez o principal treino, mas não é o único treino, tem novas tecnologias, novas residências, o hábito de uso dos carros está mudando. Então, é claro que lidar com essa transformação da indústria é algo que requer, obviamente, investimento, engajamento, não somente da montadora, a Stellantis, mas de toda a cadeia, fornecedores, concessionárias, é algo que está acontecendo e precisa de recursos. Então, os R$ 32 bilhões que foram anunciados em março do ano ado basicamente são para trazer novas tecnologias, a hibridização, a descarbonização do nosso line-up, mas também lançar produtos novos e inovadores. É questão de sempre, cada dia mais, estar próximos às exigências dos consumidores brasileiros, porque um dos pontos que para nós é fundamental, e que justifica também os R$ 32 bilhões de investimento, é que os produtos da Stellantis devem ser feitos por engenharias brasileiras, para os consumidores brasileiros. Esse é um ponto de força que a gente não quer perder, ao contrário, quer incentivar cada dia mais.
HL: Carros brasileiros feito por brasileiros.
EC: É isso mesmo.
RC: Cappellano, no ano ado a Stellantis fez um comunicado que uma nova marca de veículos elétricos chineses viria ao nosso mercado para poder fazer aí junto com as marcas que a Stellantis já representa aqui no Brasil. Eu gostaria de saber como está esse plano da Leapmotor, se você já tem uma data para o início das operações no Brasil?
EC: Estamos trabalhando intensamente para lançar a Leapmotor, eu acredito que em breve daremos notícias sobre a data de lançamento, mas o que posso garantir é que o trabalho continua forte, tem todo um grupo de trabalho que trabalha não somente nos aspectos técnicos do lançamento dos carros, mas também na preparação da rede, na preparação da comunicação de todo aquele que é relacionado a um novo branding na América do Sul e no Brasil. Então, é extremamente importante chegar a um lançamento tão relevante de uma forma muito muito abrangente, muito preparada. O nosso ponto deve ser garantir a novidade, e os pontos de força dos carros chineses, que existem as tecnologias novas, o design diferente do estilo tradicional, mas também alavancando naquelas que são as forças tradicionais da Stellantis na América do Sul e no Brasil. Então, a presença, a equipe, o conhecimento forte do mercado e a inteligência de mercado.
HL: Na questão dessas novas tecnologias é tudo para se fazer, não é, Cappellano? Fornecedores, por exemplo, vocês têm que criar uma cadeia de fornecedores. O Polo Automotivo da Stellantis em Betim/MG já tem mais de mil fornecedores, só que são fornecedores que tinham a tradição do carro a combustão, e agora vem esse carro híbrido ou elétrico. Como vocês estão fazendo para atrair esses fornecedores para cá?
EC: O processo de desenvolvimento, também de novas tecnologias, se faz com a cadeia de fornecedores, é com a indústria toda. Então, é uma oportunidade para toda a cadeia se desenvolver, nós estamos colaborando com nossos fornecedores tradicionais para trazer tecnologia para o Brasil. Às vezes ele tem tecnologia na Europa, nos Estados Unidos, os mesmos fornecedores, às vezes precisam de novos fornecedores, mas em geral nós estamos tentando alavancar ao máximo com o nosso footprint industrial, falamos, de fato, com a nossa cadeia, com todos nossos fornecedores.
HL: Vocês já estão em negociação tentando fazer uma grande campanha até mesmo com a participação do Governo do Estado, da Fiemg, da Abipeças, para poder, com os sindicatos, atrair e criar esse polo?
EC: Em geral sim. Nós estamos trabalhando, falamos no mês ado com o Governador Zema, por exemplo. Vamos dizer, tudo aquilo que é desenvolvimento, quanto mais é tratado na forma abrangente com os nossos parceiros ou então as instituições, os fornecedores, as concessionárias, é mais efetivo. Precisamos, não estamos sozinhos, de criar dinâmicas e políticas que estimulem de fato o desenvolvimento da indústria em Minas Gerais e no Brasil em geral.
RC: Cappellano, poucos meses depois de lançada a tecnologia Bio-Hybrid com o Pulse e com o Fastback, como foi essa recepção desse público, desse consumidor, que foi a primeira vez, provavelmente, que teve o a uma tecnologia disruptiva que vai, doravante, mudar a vida de todo mundo?
EC: O que eu posso dizer é que até agora a percepção do cliente é muito positiva, a reatividade do cliente em relação aos novos produtos é muito positiva. De fato, é uma tecnologia que tem uma ibilidade muito boa, mas que entrega muito em termo de, por exemplo, eficiência, na contribuição da descarbonização, então claramente é uma tecnologia que está sendo muito bem recebida pelos consumidores. Isso nos encoraja a continuar no caminho que começamos em novembro, no ano ado, há poucos meses.
HL: Essa tecnologia já está gerando, por conta de novos fornecedores, também mais empregos nas regiões onde estão localizadas as fábricas? Seja em Betim, aqui em Minas Gerais, em Goiana, Pernambuco, em Porto Real, no Rio de Janeiro.
EC: Em geral, eu diria que sim. Todas as vezes que tem esses investimentos são oportunidades de crescimentos, especialmente quando são tecnologias novas, elas acrescentam de fato oportunidades de instalação de plantas, instalação de tecnologia, e como consequência de emprego em proximidade das plantas, onde tem os nossos fornecedores.
RC: Você pode, então, nos adiantar, se for possível, na sequência desses lançamentos o próximo que vai ganhar, obviamente essa tecnologia, seria o Com T270, a Jeep seria contemplada agora com essa nova oportunidade de uma nova tecnologia?
EC: Ainda não. Vamos dizer que ao longo do ano vamos comunicar quais são os modelos que vão receber a tecnologia, mas uma coisa posso adiantar, que de fato nós estamos trabalhando, hoje, a todo vapor para introduzir novas tecnologias em todas as plantas que temos na América do Sul.
HL: Essa cadeia, além da cadeia de fornecedores, geração de empregos, como está a questão dos engenheiros? Os carros brasileiros feitos por brasileiros, agora já são 4 mil engenheiros em Betim. Essa inteligência toda dos carros está toda aqui em Betim, em Minas Gerais?
EC: É toda em Betim. O Bio-Hybrid é uma tecnologia que foi pensada e nasceu aqui em Betim, no Brasil eu diria, de forma mais geral, porque temos também outras facilities, por exemplo, a proximidade de Pernambuco, mas é uma tecnologia local. Ela está sendo trabalhada por nossos engenheiros e em desenvolvimento contínuo. Esse novo ciclo de investimentos que começou já de fato envolve muito a nossa engenharia local, que nós chamamos de Technical Center South America, é o dono dessa tecnologia. E o que é interessante é que às vezes se criam oportunidades, também, para exportar a tecnologia e a competência para fora, o que não acontecia há 10 anos atrás. Agora, a South America, agora o Brasil virou uma referência para alguns produtos, para algum nicho de mercado para outras regiões do mundo.
HL: Isso principalmente em o que você percebe? Em motor ou no modelo mesmo?
EC: Por exemplo, em motores híbridos nós temos a tecnologia flex, algo que virou muito interessante para outras áreas do mundo, também a engenharia de software de motores é algo que a gente faz por outras regiões do mundo. A engenharia da América do Sul, do Brasil, hoje é “dona” de algumas plataformas que são globais para a Stellantis, talvez seja uma oportunidade de desenvolver e crescer também em termos de competência.
HL: Cappellano, tem a questão do etanol. A Stellantis continua acreditando e apostando no etanol, o híbrido da Stellantis tem o etanol. Vocês pretendem fazer alguma campanha para incentivar o aumento do consumo e a continuidade deste produto que é de tanto sucesso, que é referência no Brasil e no mundo?
EC: Sim, em linha de princípio sim, porque nós achamos que o etanol é fundamentalmente muito consistente com a realidade do Brasil e da América do Sul, porque é ível, é econômico e faz parte, de fato, da geração de energia para o Brasil, então se encaixa muito bem com o país. Temos algumas parcerias, estamos trabalhando em algumas parcerias para estimular um uso cada dia maior, por exemplo, da tecnologia híbrida flex, então não é a única solução que temos e que estamos desenvolvendo, mas com certeza é extremamente relevante. Um dos aspectos que a gente mais toma em consideração nos projetos de investimentos é também a ibilidade dos consumidores aos produtos que nós vendemos, porque claramente as tecnologias novas que precisam ser introduzidas, seja para uma questão de descarbonização, mas também de segurança veicular, tem vários desafios, tem um custo, e a única forma de ter os carros íveis é desenvolver as tecnologias locais as mais íveis possíveis. Hoje, o potencial do mercado da América do Sul é enorme, é de até 1 carro para cada 4 ou 5 pessoas. Se a gente comparar isso com a Europa, os Estados Unidos, é ¼. Hoje, nos Estados Unidos deve ter um carro por pessoa, na Europa mais ou menos a mesma coisa, então existe ainda um potencial grande de mercado que ainda não é explorado, porque o poder aquisitivo dos consumidores ainda não chega a ser comparável com outras áreas do mundo. Então, precisamos investir em tecnologias que sejam íveis.
HL: E em estrutura também, não é? Para abastecer, para ter toda essa questão de continuidade. Agora, dá para a gente pensar no preço do carro com essas novas tecnologias, esse grande investimento que a Stellantis está fazendo? Um carro com um preço que atenda mais pessoas e que possa reduzir essa proporção de pouco mais de 4 pessoas por 1 carro aqui no Brasil, ou não?
EC: Claramente esse é o nosso foco, a nossa atenção. Qual é o ponto? Para sermos mais competitivos precisamos superar ainda alguns obstáculos. Então, por exemplo, localizar fornecedores, não importar tecnologias de fora, não importar componentes de fora é algo que ajuda muito a melhorar a competitividade do carro, a reduzir os custos.
HL: Para não ter a incidência do dólar, não é?
EC: Exato. O custo das infraestruturas, os aspectos fiscais, a alta taxa de juros são todos elementos que, hoje, não estão contribuindo para manter o custo dos carros baixo e a gente deve trabalhar para superar esses obstáculos aos poucos. Para mim, um dos aspectos mais fundamentais é localizar os fornecedores, ter uma indústria de fornecedores, de concessionárias, todo o mundo atrelado ao mercado automotivo mais eficiente.
HL: Qual é, hoje, o índice de nacionalização dos produtos da Stellantis? Em qual ponto ela conseguiu chegar?
EC: Depende muito dos produtos. Em geral, nós temos um índice de localização muito alto, mas tem ainda algumas tecnologias que não são produzidas ou que não estão presentes no país. Então, as novas tecnologias que estão sendo introduzidas pela hibridização, por exemplo a line-up, aumentam o desafio, porque precisa trazer. Então, é sempre dar percentuais específicos, vamos dizer, é alto, mas pode melhorar ainda, eu acho que é esse o desafio.
RC: Vamos falar um pouco da América do Sul, da Argentina, de Córdoba. A transferência da produção da Titano, que era do Uruguai e que foi lançada há menos de 1 ano para a fábrica de Córdoba com um novo visual, um novo motor, é o primeiro fruto daquele investimento grande que foi feito lá na fábrica da Argentina e é o primeiro fruto de uma família nova de produtos que vem por aí, fabricados lá?
EC: É isso mesmo. Nós vamos começar a produzir lá daqui a pouco uma Titano com uma nova motorização e vai ser o primeiro de uma família de produtos.
RC: E em picape a Fiat é referência. Tem a Strada, tem a Toro, e aí o mercado fica de ‘barba de molho’ quando vê uma Titano nova, com um novo visual, um novo motor, naturalmente, muito mais tecnológico e muito mais eficiente, não é?
EC: É isso que eu espero, pelo menos. (risos) Tendo investido lá para produzir um novo carro, introduzindo um novo motor, é isso.
RC: E o mercado da picape média é muito concorrido no Brasil, porque vocês foram os pioneiros na Toro, naquele segmento vocês foram os primeiros e que estão liderando até hoje. A Strada não, ela já estava aí, mas é um recorde, é um case de sucesso de mais de duas décadas na liderança absoluta, e nessa picape média tem uma concorrência grande, por isso o investimento tem que ser forte para poder superar e competir.
EC: Exatamente. Para nós, para a Stellantis, era um pouco neste momento. Então, nós tínhamos a Strada, a Toro, a Rampage, que também é um carro de muito sucesso que lançamos no final de 2023, mas faltava ainda uma picape maior, e eu acho que a Titano responde um pouco a essa demanda. É um segmento muito interessante, as picapes são a cara do Brasil, então a gente não podia não ter um carro no segmento das picapes grandes.
HL: Foram mais de 144 mil unidades vendidas da Fiat Strada no ano ado, é líder de mercado. Como vocês vão fazer para continuar mantendo essa liderança?
EC: Produzindo o que os consumidores brasileiros querem, tentando inovar cada dia mais, tentando responder à exigência do mercado, garantindo a qualidade dos nossos produtos, é assim que a gente tenta manter uma história que é uma história de inovação, de presença no Brasil, de crescimento no Brasil, então claramente é um dos focos que a gente nunca deixa para trás. Nós, há quase 50 anos de história no Brasil, uma boa parte desses 50 anos tem Strada também, é um produto muito querido, a gente acredita muito no futuro da Strada.
RC: Ainda sobre a picape, você mencionou aí a marca RAM, parte integrante do hall de marcas representadas pela Stellantis. Esse universo de picape foi o que mais protagonizou lançamento ano ado e a RAM está vendendo como nunca, está fazendo um barulho aí no mercado, você vê RAM na rua, é um negócio impressionante e é um carro de alto valor agregado, não é um carro com preço tão razoável, é um carro de alto valor agregado e entrega muito. Para a RAM, qual é o seu plano para esse ano de 2025 e para frente? É investir cada vez mais no tamanho da picape?
EC: Investir mais, com certeza investir mais. A RAM é um brand que… estávamos falando antes de Strada, a RAM é um brand que também se encaixa muito com a nossa realidade, com o nosso mercado, então é uma história que está tendo sucesso desde os carros importados que colocamos no mercado há alguns anos até o primeiro carro RAM produzido, o único e primeiro carro RAM produzido fora dos Estados Unidos, que é o RAM Rampage. Então, é uma história de sucesso que a gente quer continuar.
RC: O primeiro fora dos Estados Unidos, isso tem um peso.
HL: É histórico
EC: Primeiro e único até agora carro RAM produzido fora dos Estados Unidos.
HL: Tem muito mercado ainda para conquistar e para fazer aí, não é?
EC: Tem produtos que casam muito com o mercado, nós estamos apostando muito na RAM como um carro de sucesso, como um brand de sucesso para o Brasil.
HL: Cappellano, a gente tem um mercado que cresceu aí quase 10% em relação ao ano ado, de acordo com os números da Anfavea - Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores com 2 milhões 550 mil unidades produzidas e a Stellantis aí com mais de 23% de market share do mercado, mais de 916 mil unidades, quer dizer, é importantíssima a presença dela. Qual é a sua avaliação para o mercado de 2025? Ele continua nessa mesma toada, nessa mesma velocidade de crescimento ou temos outros fatores aí que vão precisar ser avaliados com essa alta taxa de juros, a questão dos financiamentos, como você acha que essa conta fecha?
EC: A Anfavea declarou nas últimas pesquisas que de fato o crescimento previsto para 2025 é próximo a 6%, 7%. Claramente precisamos monitorar algum elemento que pode de qualquer forma limitar o crescimento do mercado, a taxa de juros é um bom exemplo, mas vamos dizer, existe uma demanda ainda reprimida. Agora, a taxa de juros cresceu também no ano ado, mais ou menos 45% dos carros vendidos são financiados, então precisamos monitorar, vamos ver como evolui, porque é verdade que a taxa de juros pode limitar, mas no ano ado, por exemplo, na história do Brasil foi a maior quantidade de vendas de carros de sempre, se a gente considerar mercado dos usados e dos novos foram vendidos quase 14 milhões de carros, e foi um recorde também na quantidade de crédito que foi dado pelos bancos aos consumidores. A taxa de inadimplência caiu muito, foi de 4% no ano ado, então são dados que ficam um pouco contrastantes com aumento da taxa de juros, mas que de fato alimentam ainda o potencial do mercado. Precisamos ver. Claro que, de novo, a competitividade, a desvalorização do real que aconteceu, a taxa de juros são elementos que podem mudar o trem de mercado.
HL: É, tem que ver se a renda do brasileiro também se sustenta esse ano para continuar com essa pujança toda em compras.
EC: Exatamente.
HL: E aí, no Mercado Nacional o que você está enxergando pela frente, que nós temos esse ano a instalação das fábricas chinesas aqui, dos elétricos, o que vocês estão prevendo para competir em preço com eles?
EC: Então, as montadoras chinesas vão provavelmente montar carros no Brasil. Algumas delas anunciaram que vão montar carros no Brasil, acho que não é produção, é montagem. Não vai ser, provavelmente, o carro elétrico a ser vendido, porque hoje o mercado de carro elétrico puro ainda não tem uma demanda muito grande, tem uma questão de infraestruturas, uma questão de custo e ibilidade do preço do carro, mas provavelmente vão ter outras motorizações. Agora, eu diria que o importante é que haja uma competição igualitária, nas mesmas condições. A competição geral é sempre bem-vinda, atrai estímulos, atrai a novidade para a indústria, atrai tecnologia, atrai benefícios, então o importante é sempre garantir uma competição que seja certa.
HL: Mas o certo é que a Stellantis está preparada para fazer frente a essa competição dos chineses que vem avançando no Brasil e que estão olhando a maior fábrica fora da China de um concorrente.
EC: Exatamente. Nós temos produtos, temos tecnologias, estamos investindo para introduzir as novas tecnologias necessárias, então vamos competir com toda nossa competência, nossa força, vamos tentar ser líder mais um ano no mercado.
HL: E essa questão dos preços também preocupa? Por exemplo, no caso dos elétricos, eles chegarem a preços parecidos com o carro a combustão, em pouco tempo que vai tendendo o mercado. O que você vê nessa questão, nessa equação?
EC: De novo, é importante que as condições de mercado, as ofertas para os consumidores sejam colocadas em condições igualitárias. Então, se não tiver a pressão, por exemplo, de vender abaixo do custo do carro, assim, vamos dizer, a competição vai trazer depois os estímulos naturais para competir. De novo, não é a competição que preocupa, isso sim vai trazer novas dinâmicas na indústria.
HL: A importação preocupa?
EC: A importação hoje preocupa se a oferta do carro não é consistente com o custo do carro. Se é um preço igualitário, não preocupa. De novo, eu acho que está havendo um movimento das instituições do Governo para garantir que as competições sejam igualitárias no mercado, e isso é fundamental.
HL: Esse relacionamento com o Governo Federal tem sido nesse sentido, né? Vocês estiveram recentemente reunidos com o Presidente Lula.
EC: Exato. Hoje, o que aconteceu? De fato, no mundo os Estados Unidos fecharam muito as importações, a Europa fechou a importação, a Europa teve também alguns processos em que foi apurado algum caso de dumping, então decidiram colocar imposto de importação maiores, acho que chegou a ser 38%. Acho que isso faz parte um pouco de uma avaliação que tende a garantir uma competição igualitária nos mercados, então eu acredito que também o Governo Brasileiro, as instituições brasileiras estejam olhando isso com um nível de interesse, de cuidado.
RC: Dentro desse assunto que a Helenice fala de margem de mercado, hoje, foi uma coincidência, eu recebi uma imagem do Mercado Global, da participação de cada País ou cada Continente, então claro que a China lidera ali em cima, depois vem os Estados Unidos, depois vem o Japão e depois vem a Alemanha. O Brasil já teve um protagonismo quando lançou quase 3 milhões de automóveis.
EC: O potencial do Brasil ainda é muito grande.
RC: Pois é. A gente precisa voltar a esse protagonismo, como nós tivemos há alguns anos. O que precisa, exatamente, para isso acontecer?
HL: Para a fábrica rodar três turnos.
EC: Precisa criar um sistema competitivo que possa reduzir os custos de produção, um pouco daquilo que eu estava falando antes. Não podemos ter uma fonte de peças, de fornecimento que venha do exterior, a cadeia de fornecedores deve estar localizada. Precisamos de infraestruturas, precisamos de um sistema fiscal de regras que seja competitivo não somente para o mercado interno, que é um mercado que tem muito potencial para crescer, mas também para exportar. Hoje, a Indústria Brasileira é madura para poder exportar em toda a América do Sul pelo menos, senão também em outros países, em outras regiões, então é isso, é ser mais competitivos para poder reduzir os custos do carro e ampliar a possibilidade de o ao geomercado, que ainda é limitado.
HL: Essa reforma tributária a por aí? Ela resolve em parte essa questão do custo do carro, que é historicamente uma das demandas do setor, né?
EC: Eu acho que a direção é a direção certa, e há vários anos, agora já com a Rota 2030, o programa que tinha anteriormente, de fato o Governo Brasileiro tem uma visão de desenvolvimento da Indústria, está construindo o seu caminho ao longo do tempo. O que vejo é muita consistência. Tem ainda gap? Tem.
HL: Quais são os que você definiria para discutir melhor com todos os entes?
EC: De fato, completar a cadeia de fornecedores, melhorar as infraestruturas, melhorar, talvez, ibilidade ao crédito, o sistema fiscal.
RC: A tributação, né.
EC: Hoje, quando a gente tenta exportar, tendencialmente nós exportamos também os tributos. É uma pena, porque estamos perdendo oportunidades. As exportações desse ano acho que cresceram um pouco com a retomada do mercado, na segunda parte do ano, com a retomada do mercado argentino, mas existem países na América do Sul onde é mais econômico importar um carro que vem da Europa ou da China do que importar um carro que vem do Mercosul, não quero dizer somente do Brasil, mas do Mercosul.
RC: No Uruguai, eu acredito que seja assim, né?
EC: No Uruguai, por exemplo. Então, isso é uma pena, porque até de fato fora do Brasil, que hoje tem mais ou menos 2.5 milhões de carros como mercado, o mercado da América do Sul são 4 milhões, então tem 1.5 milhão de carros que poderiam ser servidos aqui da Indústria Brasileira, mas de fato ainda tem limitações. Então, isso pode ser uma fonte de estímulo de crescimento.
HL: E tem a questão da ociosidade também, não é? Nessa produção de 2 milhões e 550 mil unidades, a capacidade industrial está com cerca de 45% de ociosidade. No caso da Stellantis, houve “over capacity” ou não? As fábricas vão continuar do jeito que estão?
EC: Nesse momento, nós não temos “over capacity” de nossas plantas. Todas as nossas plantas estão trabalhando a “full capacity”, pode ser em dois turnos ou em três turnos, dependendo da linha de produção, mas nesse momento nós não temos um excesso de capacidade. Agora, é muito importante, de qualquer forma, para a Indústria Automotiva ter a capacidade de gerenciar os piques também negativos de produção, porque sabemos que é uma Indústria cíclica, então isso faz parte um pouco da flexibilidade que precisamos ter nas plantas, em todas as nossas plantas para atender às variações de mercado. É sempre uma questão de gerenciamento de custo fixo, mas hoje a Stellantis não tem problema de excesso de capacidade.
HL: Ou seja, não se corre risco nenhum de precisar fechar a fábrica ou lidar com uma realidade de volumes diferentes do que era no ado, né?
EC: Hoje, nós não estamos enxergando isso. Claramente, é um mercado, assim, competitivo, pode mudar todos os dias, mas hoje todas as nossas plantas estão trabalhando. Cada planta tem um próprio papel, serve brand, plataformas diferentes, então hoje estamos trabalhando de uma forma consistente com o tamanho do mercado, a demanda de mercado.
RC: E já que estamos falando de produção, aumento e lançamento, o Fiat Grande Panda, que foi lançado recentemente na Europa, serviria de uma inspiração, já que ele é feito numa plataforma global, multiuso, pode ser elétrica pode ser a combustão, pode ser os dois, para breves lançamentos no Brasil, para os modelos de entrada, numa substituição, por exemplo, ou numa convivência com o Argo, com o Mobi, existe um programa nesse sentido?
EC: A vantagem de ter uma empresa que tem presença em muitas regiões é oferecer, também, a oportunidade de poder aproveitar as melhores tecnologias que existem também fora, é compartilhar. Então, é o caso de South America para fora, mas também de fora para South America. Então, existem, claramente, sinergias nesse sentido, mas um ponto firme para nós, que a gente não vai mudar, isso continua sendo uma vantagem competitiva que temos, é que tudo aquilo que nós lançamos no Brasil é pensado para o Brasil. Então, você tem uma plataforma, ok, podemos pegar alguma coisa, podemos pegar algumas tecnologias, alavancar sobre a experiência de fora, mas geralmente os carros são carros feitos para a South America, desenvolvidos para nós. O Flex Fuel é o exemplo historicamente mais relevante, mas o Bio-Hybrid, também o design se adapta muitas vezes.
HL: À nossa realidade, não é?
EC: Tem uma coisa muito engraçada que eu vou contar para vocês.
HL: Conta.
EC: Eu claramente sou italiano, então os meus gostos são gostos europeus, vamos dizer, e eu gosto de carros coloridos, amarelo…
HL: Eu também acho lindo, alaranjado, vermelho, é tão bonito.
EC: Quando eu vou no Centro de Design aqui em Betim, a minha grande briga é sempre para as cores, porque eu vejo alguns carros e digo “mas por que não vão fazer isso amarelo? Eu quero amarelo”. Os designers me matam, sempre falam “não, isso daqui não funciona, porque o interior deve ser mais escuro, porque é um carro mais sério”.
HL: E se começar a criar essa vontade no consumidor da novidade, será que não…
EC: Com certeza, claramente sim. O mercado está mudando, as exigências estão mudando.
HL: Não é? As pessoas querem ser diferentes, querem sair um pouco daquele efeito manada.
EC: Tem coisas que mudaram radicalmente e rapidamente. Hoje, por exemplo, a demanda pelos nossos carros híbridos é alta, até 5 anos atrás a gente nem falava disso. As exigências mudam, muda a atenção ao que acontece fora, muda a atenção ao ambiente, mudam as exigências, muda também o senso estético, em alguns casos, por isso eu falei antes que às vezes a competição tem esse lado positivo que estimula a mudança, então nós devemos estar muito atentos a ver como a sociedade, os gostos, as pessoas mudam e se adaptam por consequência.
HL: E aí o que você pensa em relação a esses carros diferentes, cores diferentes, você está querendo implantar mais cor lá, você está querendo implantar essa cultura?
EC: Eu gosto, mas daí para convencer os meus designers, está difícil (risos)
HL: Está difícil (risos)
EC: Depende. Vamos dizer, nós temos hoje vários brands no mercado brasileiro e cada brand tem um papel diferente de posicionamento, então tem brand que se presta mais as cores, brand menos, cada brand (marca) tem uma própria identidade e nós devemos manter e desenvolver a identidade de cada brand sem homologar tudo, sem fazer tudo igual, isso é algo que devemos manter e estimular.
HL: Conta para a gente, como vai ser a festa de 50 anos do Polo Automotivo Stellantis em Betim? É no ano que vem, não é, Cappellano?
EC: Eu quero fazer uma grande festa, porque são os meus 50 anos, os 50 anos do Polo…
HL: Ah, coincide?
EC: Isso mesmo, 50 anos do Polo em Betim, 50 anos da Fiat no Brasil, então acho que vale a pena comemorar, é um momento importante para a Stellantis, é um momento importante para Minas Gerais, então a gente gostaria muito de comunicar isso, de transmitir isso para os nossos consumidores.
HL: Ainda mais que na festa de 45 anos foi todo mundo de máscara, foi uma coisa bem pequena, não deu para chamar ninguém lá quase, por conta da pandemia, então agora merece, né?
EC: Merece. E tem uma coisa, a Fiat hoje é uma brand (marca) muito brasileira. Eu diria que em proporção, claramente nasceu na Itália, é de lá que nasceu a história, mas hoje o conhecimento, a percepção, a proximidade com os consumidores no Brasil são iguais àquela que está na Itália, senão até maior.
HL: É uma coisa que virou um patrimônio nosso, não é?
EC: É de fato um brand brasileiro.
HL: Lá tem toda a história, é o maior Polo Automotivo do Brasil, atualmente, o de Betim. Você pretende fazer alguma coisa diferente lá, daqui pra frente? Qual é o seu sonho para o Polo Automotivo em Betim?
EC: É uma evolução contínua. Não é uma reforma hoje, fecho, viro a chave e vira uma nova Betim. É uma evolução contínua que continua desde 5 anos a 49 anos atrás e é um desafio contínuo de renovar, introduzir novas tecnologias, novas, também, formas de gerenciar a indústria, não somente de um ponto de vista técnico, mas também de como, por exemplo, se aproximar dos consumidores, qual é o processo de venda, qual é o marketing, quais são as cores, que falamos antes, é uma evolução contínua. É fundamental trabalhar na base de pessoas para garantir que o processo construtivo de desenvolvimento das pessoas continue, porque são as pessoas que fazem as coisas acontecerem. Então, a Betim do futuro vai ser muito diferente do que é hoje, mas é um caminho que as gerações de hoje e de amanhã vão continuar a trabalhar. Então, nós devemos trabalhar muito nas pessoas e nas equipes, hoje, para garantir e continuar a ter esse processo contínuo de melhoria.
RC: A Stellantis faz 4 anos agora em janeiro, de fundação, foi uma coisa que modificou o mercado como um todo, porque foi uma associação de vários brands, várias marcas importantes, quando a Jeep veio, a Peugeot, a Citroën, a própria Fiat obviamente, a RAM que chegou agora, possivelmente essa chinesa que vem por aí. Você poderia fazer um resumo, rapidamente, desses quatro anos? O que você vê de mudança de mercado mesmo, de conceito, mas de costumes, por exemplo, porque tem muita gente que fica com um pé atrás com a Peugeot, com o Citroën, que é francês, mas agora não, agora faz parte da Stellantis e isso gera uma confiança, gera uma credibilidade, isso é muito importante.
EC: Eu acho que, após 4 anos, claramente tudo aquilo que é relacionado ao desenvolvimento de carro toma um tempo para virar algo de concreto, e desde o ano ado nós começamos a recolher os primeiros frutos de Stellantis tentando buscar o melhor que existia nos dois mundos, a hexa Fiat de um lado, a hexa Peugeot e Citroën do outro. Agora estamos começando a coletar nos nossos produtos os benefícios, por exemplo, lançamos há poucos meses o (Citröen) Basalt, um carro que foi desenvolvido pela nossa engenharia aqui em Betim, então está amadurecendo, está melhorando, está sendo percebido uma forma diferente, isso nos estimula a continuar num caminho virtuoso de aposta em todos os nossos brands para o Brasil.
HL: O que você espera do próximo CEO mundial da Stellantis, Cappellano? O Antonio Filosa, que foi aqui o Presidente da Stellantis na América do Sul, faz parte da comissão, o que que você espera aí para continuar esse bom relacionamento?
EC: Eu acho que o board da Stellantis está trabalhando há muito para identificar a pessoa certa e com certeza teremos aí em breve algumas novidades. Eu diria, é fundamental nesse momento manter um foco forte nas exigências de cada mercado e cada região, mas isso está acontecendo, então por enquanto nós estamos muito tranquilos, fazendo nosso trabalho do dia a dia, sabendo que até junho o nosso CEO Global, a gente tem o John Elkann, vamos ter com certeza uma nova pessoa nos liderando.