A federalização da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig) para abater parte da dívida de R$ 156,57 bilhões do Estado com a União pode esbarrar em uma sociedade constituída para a exploração do nióbio em Araxá, no Alto Paranaíba, até 2032. A lavra, que é o principal ativo da Codemig, é realizada por uma sociedade de propósitos específicos, conhecida, no mercado, como t venture, entre a estatal e a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) em vigor desde 1972.
Enquanto a Codemig tem 51% das ações, a CBMM tem 49%. A sociedade, conhecida como Companhia Mineradora do Pirocloro de Araxá (Comipa), explora, de maneira igualitária, duas minas na cidade do Alto do Paranaíba: uma do Estado de Minas Gerais e outra da CBMM. A Comipa, então, rea o pirocloro para a CBMM, que, por sua vez, é responsável em beneficiar, industrializar e comercializar os produtos finais de nióbio. Como contrapartida, a Codemig recebe 25% do lucro líquido da operação.
Inclusive, por conta da sociedade, quando encaminhou à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) uma proposta para privatizar a Codemig, o governo Romeu Zema (Novo) chegou a se sentar à mesa com a CBMM para tentar construir um arranjo. O TEMPO apurou que o governo teria oferecido à sócia a jazida que é do Estado e, em troca, ter 25% das suas ações, então estimadas em R$ 40 bilhões, para vendê-las. À época, o acordo não teria sido viabilizado diante das dificuldades de articulação do governo com a AMLG.
Como é válida até 2032, a sociedade com a CBMM deve estar no cálculo do Ministério da Fazenda para analisar a viabilidade da federalização da Codemig. A Fazenda apenas informou que “a solicitação de Minas Gerais está em análise nas áreas técnicas”. A consulta do governo Zema se há o interesse da União em federalizar a Codemig foi feita em 26 de outubro após o secretário de Fazenda, Gustavo Barbosa, ser provocado pelo deputado estadual Professor Cleiton (PV) em uma audiência pública na ALMG.
Em coro à Fazenda, o governo Zema pontuou que a federalização aguarda análise do ministério. “Somente após uma proposta por parte do governo federal será possível analisar possíveis detalhes e impactos no processo”, acrescentou o Palácio Tiradentes. Após o presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD), apresentar a proposta alternativa à adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que inclui a federalização da Codemig, o ministro Fernando Haddad pediu até março de 2024 para analisá-la.
O que diz a CBMM. Questionada se o arranjo com o governo Zema teria sido, de fato, construído e se ele estaria de pé caso a Fazenda deseje absorver a Codemig, a CBMM observou que a federalização ou a privatização da Codemig é uma decisão que cabe ao governo de Minas Gerais. “Independentemente do que ocorrer, os contratos que formalizam a parceria permanecem válidos e vigentes até 2032”, emendou a empresa, cujos acionistas majoritários são os irmãos Moreira Salles.
Cleiton, que chegou a propor a federalização da Codemig à ALMG ainda em fevereiro, afirmou que, independentemente de qual acordo seja feito entre União, Estado e CBMM, a federalização será referendada. “O que a gente enquanto bloco entende é a importância de manutenção desses ativos em poder do Estado, representado pela União, e, consequentemente, evitando aí a venda a um preço bem abaixo do mercado como queriam fazer”, acrescentou o deputado.
Ex-integrantes do governo de Minas Gerais ponderam que o valor de mercado a ser estimado para a Codemig está diretamente ligado à sociedade de exploração com a CBMM. Isso porque, mais do que a jazida de pirocloro que é do Estado, a capacidade de beneficiar, industrializar e comercializar produtos de nióbio seria o ativo mais importante. “A Codemig, em si, não vale nada. O que vale é a mina, e, na verdade, a produção de nióbio”, argumentou, de forma reservada, um dos egressos do governo.
Entretanto, o valor de mercado da Codemig é fruto de divergências. Na mesma audiência em que se comprometeu a consultar se a União teria o interesse em assumir a Codemig, Barbosa estimou que, de acordo com estudo do Goldman Sachs, a Codemig valeria R$ 25 bilhões. Por outro lado, Cleiton projetou que a estatal, na verdade, poderia ser avaliada em até R$ 60 bilhões. “O (ex-governador do Paraná) Roberto Requião, enquanto senador, disse que o Goldman Sachs subvalorizou o Banestado quando ele foi privatizado”, rebateu o deputado.
BNDES. Há dois anos, ainda durante o governo Jair Bolsonaro (PL), o BNDES chegou a encaminhar uma carta ao governo Zema para manifestar o interesse em comprar ações da Codemig por meio do BNDESPAR - subsidiária que atua no mercado de capitais. À época, uma das contrapartidas exigidas pelo BNDES era de que o governo Zema tivesse a autorização para negociar 100% das ações e não apenas 49%, como tem hoje. Apesar do interesse, as conversas não avançaram.