SAÚDE SOBRECARREGADA

Com Risoleta de porta fechada em BH, pacientes esperam no chão e em macas improvisadas: 'revoltante'

Pronto-socorro suspendeu atendimentos por falta de estrutura e espaço para assistência; cirurgias eletivas estão suspensas

Por Mateus Pena e Isabela Abalen
Publicado em 22 de janeiro de 2025 | 13:39

O Hospital Risoleta Tolentino Neves, na região de Venda Nova, em Belo Horizonte, vive um cenário de caos nesta quarta-feira (22 de janeiro), após a interrupção do atendimento a novos pacientes devido à superlotação do pronto-socorro. Em meio à dor, revolta e sofrimento, muitos pacientes — alguns à espera há horas — clamam por atendimento e, em alguns casos, por socorro. Belo Horizonte enfrenta um colapso no sistema de saúde devido à "alta demanda por leitos ortopédicos de urgência", segundo a prefeitura. Todas as cirurgias eletivas do tipo estão suspensas por duas semanas.

Jorge Eduardo Pinto, de 63 anos, armador da construção civil e morador do bairro São Benedito, em Santa Luzia, na região metropolitana de BH, é um dos pacientes surpreendidos pela suspensão dos atendimentos no Risoleta Neves. Deitado sobre um pedaço de papelão na porta do pronto-socorro e sentindo fortes dores, Jorge, que mora sozinho, chegou ao local às 8h. Ele relatou o desespero com a demora no atendimento. "Estou com falta de ar e, se ficar em pé e entrar, posso desmaiar por causa do calor. Por isso, preferi ficar do lado de fora, caso desmaie", lamentou, conformado diante da situação caótica.

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Em cadeira de rodas, paciente se revolta por falta de atendimento

Com um pé quebrado e sentada em uma cadeira de rodas, a cuidadora de idosos Paloma Mendes, de 44 anos, manifestou revolta com a demora no atendimento. Ela também chegou ao local pela manhã, em um carro de aplicativo, e foi abordada por um segurança do hospital assim que desembarcou. “Cheguei aqui e não tem atendimento para a gente. E o segurança ainda achou ruim porque o motorista parou o carro na porta. Eu não tenho condições nem de sair da cadeira de rodas", reclamou. 

A cuidadora de idosos reforçou que depende do Sistema Único de Saúde (SUS) e, por isso, lamentou não ter previsão para ser atendida. "Acho uma falta de respeito o jeito que as coisas estão [na saúde pública]. Está superlotado. A saúde das pessoas não importa", lamentou Paloma.

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Irmão com fratura, moto roubada: prejuízo em dobro

Desde 1h da manhã desta quarta-feira (22 de janeiro), o alinhador e balanceador de carros Guilherme Augusto vive momentos de tensão. O irmão dele sofreu um acidente, teve uma fratura exposta e, para piorar, Guilherme teve a moto roubada do lado de fora do hospital. Ele relatou que o irmão, gritando de dor, foi colocado em uma maca, mas sem previsão de atendimento. "Tive que ajudar a colocá-lo na maca. Deixaram-no de lado, ninguém explica nada. Na hora da triagem, fui resolver a documentação dele e, em questão de 10 minutos, minha moto foi roubada", conta.

O caso do irmão de Guilherme se enquadra nos atendimentos ortopédicos de urgência, exatamente o que tem causado sobrecarga no SUS-BH e no Risoleta Neves. "É revoltante, porque estou, até agora, esperando alguma notícia dele [o irmão internado]. Sempre que abrem a porta, vejo que ele está ali, no canto, jogado. Fica difícil, porque a gente, que é trabalhador, não tem a condição de pagar um convênio. Vem ao SUS esperando segurança e um bom atendimento. Não acontece, é só enrolação para a gente que trabalha", lamentou Guilherme.

O que está acontecendo no Risoleta Neves? 

O Risoleta Neves interrompeu o atendimento a novos pacientes na manhã desta quarta-feira (22 de janeiro). A medida é crítica, pois o pronto-socorro da unidade é porta-aberta e deveria funcionar 24 horas sem restrições. Segundo a direção, uma superlotação saturou a capacidade assistencial do hospital. 

Segundo a diretoria do pronto-socorro de Venda Nova, a unidade está atendendo o dobro de pacientes em relação à capacidade assistencial. O Risoleta pode assistir até 90 pacientes simultaneamente, mas está com 180 usuários itidos. "Desde 2023, o Pronto-Socorro vive com superlotação. Esta é a primeira vez, desde então, que essa medida é adotada. Neste momento, o Risoleta não tem condições estruturais e de espaço físico para receber novos pacientes", informou o hospital.

O Risoleta notificou a superlotação à Rede de Urgência e Emergência de BH, solicitando apoio para encaminhar parte dos pacientes a outras unidades do Sistema Único de Saúde (SUS-BH). Por enquanto, o pronto-socorro está adotando medidas de apoio diagnóstico e outros recursos para possibilitar mais altas hospitalares. "O Hospital Risoleta lamenta o desconforto gerado para a população de referência neste momento, mas reafirma seu compromisso de, mesmo diante de todos os desafios, prestar uma assistência aos pacientes com segurança e qualidade", afirmou a direção.

Cirurgias suspensas e rede não emergencial do SUS-BH como reforço

Também nesta quarta-feira (22 de janeiro), todos os hospitais não emergenciais da rede do Sistema Único de Saúde (SUS-BH) começaram a priorizar cirurgias ortopédicas de urgência, que têm sobrecarregado a rede e causado superlotação no Risoleta. A medida foi definida por um ofício assinado pela Regulação do o Hospitalar da Saúde de Belo Horizonte, ao qual O TEMPO teve o, suspendendo a realização de cirurgias eletivas do tipo por duas semanas.

A interrupção dos procedimentos ocorre simultaneamente ao fechamento do bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL), na região Centro-Sul, onde parte das cirurgias vem sendo cancelada desde o final de dezembro. A última vez que o Executivo precisou suspender tratamentos cirúrgicos foi durante a pandemia de covid-19, em um cenário de crise global.

O ofício foi enviado aos diretores de sete hospitais: Baleia, Clínicas (UFMG), Evangélico, Célio de Castro, São Francisco de Assis, Universitário Ciências Médicas e Santa Casa de BH. 

De acordo com a PBH, a fila atual é de uma média diária de 100 pacientes que precisam de leito ortopédico de urgência. Em duas semanas, logo, o número é de no mínimo 1.400 cirurgias. “Por isso a necessidade da implementação dessa medida, de forma a garantir atendimento ágil aos pacientes graves. A estratégia faz parte de um plano de ações regular da Secretaria Municipal de Saúde sempre que há maior demanda de leitos ortopédicos no município”, argumenta o Executivo.