Apesar de ter a dívida de cerca de R$ 162 bilhões de Minas Gerais com a União sobre a mesa, o encontro entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o governador Romeu Zema (Novo) nessa quarta-feira (6/3), no Palácio do Planalto, foi visto, em um contexto maior, como um gesto republicano. A agenda, sem a presença do presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD), que encabeçou as negociações por uma alternativa à adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), foi a primeira reunião fechada entre Lula e Zema desde a posse do presidente em 2023.
Até então, Zema havia sido recebido em Brasília apenas por ministros e secretários. Em janeiro, quando desistiu de ir à solenidade de um ano dos ataques às sedes do Planalto, do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF), o governador se encontrou com o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron. Ainda no ano ado, logo após Pacheco apresentar a Lula a alternativa à adesão ao RRF, Zema foi recebido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e pelo ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa.
A reunião foi descrita a O TEMPO por presentes como amistosa. Além de Lula, Rui Costa, Haddad e o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira receberam Zema. A comitiva do governador contou com o secretário de Governo, Gustavo Valadares, o secretário-chefe da Casa Civil, Marcelo Aro, a secretária de Planejamento e Gestão, Luísa Barreto, e o secretário de Fazenda, Luiz Claudio Gomes. O presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Tadeu Martins Leite (MDB), o Tadeuzinho, também estava presente.
Ao fim, após cerca de uma hora, o presidente, em uma brincadeira, chegou a perguntar a Zema onde estava o queijo que ele lhe daria de presente. À imprensa, depois do encontro, o governador chegou a afirmar que Lula é tão democrata quanto ele. "Divergência de opinião nós temos até com cônjuge. O que dizer então com os demais?", disse. Ele, aliás, foi o único a falar após a agenda - Rui Costa, Haddad e Silveira, por exemplo, não deram coletiva. As falas de Zema foram as únicas utilizadas em um texto divulgado pelo Planalto sobre o encontro às 21h46 de quarta.
Pouco depois, às 21h53, em uma rede social, Lula publicou uma foto da agenda no Planalto. “Recebi hoje o governador Romeu Zema, de Minas Gerais, no Palácio do Planalto. Conversamos sobre a dívida do Estado e o acordo de Mariana, buscando soluções para o melhor de Minas e para sua população”, resumiu o presidente. Um interlocutor do Palácio Tiradentes observou que “a política é feita de gestos”. “A gente espera que a reunião tenha sido o pontapé inicial de uma relação cordial com o governo federal”, emendou.
A agenda foi confirmada na véspera, na última terça (5/3). Lula atendeu a um pedido de Zema, que, na semana ada, encaminhou um ofício ao gabinete da presidência para solicitar uma reunião em que, além da dívida, fosse discutida a repactuação do acordo de reparação de Mariana. Quando veio a Belo Horizonte, o presidente teria prometido a Zema recebê-lo em Brasília. Para outro interlocutor do Palácio Tiradentes, a agenda amenizaria críticas a Lula por não receber o governador.
Fontes do Palácio do Planalto, por sua vez, ponderam que a postura de Lula não é surpresa, já que o presidente, por exemplo, já recebeu, em diferentes oportunidades, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que foi ministro da Infraestrutura de Bolsonaro, e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), que, assim como Zema, apoiou a reeleição do ex-presidente. A avaliação é a de que, agora, o governador de Minas estaria correndo atrás do prejuízo após Pacheco ter encabeçado uma alternativa à adesão ao RRF.
Apesar de a presença não estar prevista, a ausência de Pacheco, que já disse que Lula o quer como candidato ao governo de Minas Gerais em 2026, surpreendeu alguns dos presentes. Entretanto, interlocutores do presidente do Congresso Nacional minimizam o episódio, já que, segundo argumentam, a reunião era institucional, ou seja, entre o presidente da República e o governador de Minas, e, portanto, não caberia a presença de Pacheco.
A ausência alimentou expectativas de uma eventual descaracterização da proposta apresentada por Pacheco. Quando deixou a reunião, Zema, por exemplo, afirmou que Haddad teria se comprometido a apresentar, até o fim de março, “uma proposta de aperfeiçoamento do RRF”. Além disso, Lula e os ministros não teriam abordado durante a reunião a sugestão dada pelo senador para federalizar a Cemig, a Copasa e a Codemig para abater parte da dívida, que, inclusive, é estudada por um grupo de trabalho do Tesouro.
A hipótese de desidratação da proposta, que já não deve mais contar com os recursos de Mariana para abater parte da dívida, não preocupa parlamentares próximos do presidente do Congresso. A avaliação é que, do ponto de vista político, Pacheco sairia vitorioso de qualquer lado, uma vez que as discussões tomaram outro rumo desde que ele entrou na negociação. Caso a proposta por ele apresentada seja contemplada, ele ganha, dizem eles. Caso a proposta seja descaracterizada, ele também sairia vitorioso, porque a iniciativa em buscar uma alternativa à adesão ao RRF foi dele.
Interlocutores acrescentam que estão seguros de que, independentemente da avaliação da viabilidade da proposta apresentada pelo o presidente do Senado, o Planalto deixará claro que quem iniciou as discussões foi o presidente do Congresso Nacional. O entendimento é que, enquanto as agendas forem institucionais, inicialmente o senador não estará presente. Se o rumo tomado for para angariar capital político, Pacheco participará.