BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a defender uma reforma nas instituições que compõem a Organização das Nações Unidas (ONU), e declarou que o Brasil considera apresentar uma proposta de reestruturação para ampliar a representatividade, principalmente do Sul Global.

Lula também apontou a taxação de grandes fortunas como uma forma de combater desigualdades e prejuízos climáticos. "A taxação de super-ricos é uma forma de combater a desigualdade e direcionar recursos a prioridades de desenvolvimento e ação climática”, declarou.

O presidente falou nesta quarta-feira (25), na abertura da reunião ministerial do G20 (grupo das maiores economias do mundo). O evento aconteceu em Nova York, nos Estados Unidos.

Ele citou que o Brasil tem "a luta contra as desigualdades em todas as suas formas” no centro das prioridades no comando do G20, e o primeiro eixo dessa preocupação gira em torno da inclusão social.  

O presidente voltou a comentar sobre a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que será oficialmente lançada em novembro, e colocou a iniciativa como um meio para “mobilizar recursos técnicos e financeiros para promover uma cesta de políticas públicas de eficácia comprovada contra esses flagelos”. 

Outro ponto destacado por Lula como prioridade é o enfrentamento das mudanças climáticas. Ele mencionou que os países que fazem parte do G20 são responsáveis por 80% das emissões globais de gases de efeito estufa e enfatizou a importância de uma missão para limitar o aquecimento a um grau e meio.

Lula também ressaltou a aprovação do primeiro documento multilateral sobre bioeconomia, reforçando a necessidade de ações coordenadas para enfrentar esse desafio.

Brasil considera propor reforma de Carta da ONU 

Lula defendeu a reforma da governança global como o terceiro eixo de atuação do Brasil no comando do G20. Segundo Lula, “a comunidade internacional está correndo em círculos” e não consegue responder aos desafios globais porque trocou o multilateralismo por ações unilaterais ou arranjos excludentes”.

“O Brasil considera apresentar proposta de convocação de uma Conferência de Revisão da Carta da ONU", declarou sobre o documento que formou a ONU em 1945, logo após a Segunda Guerra Mundial. A intenção, segundo ele, é ampliar a representatividade, em especial da África, América Latina e Caribe.

Ele disse que 51 países fundaram a ONU, e hoje são 193 integrantes. "Cada país pode ter sua visão quanto ao modelo de reforma da governança global ideal. Mas precisamos todos concordar quanto ao fato de que a reforma é fundamental e urgente”, completou. 

O presidente frisou que há ausência de trabalho conjunto “porque as instituições multilaterais estão desacreditadas” e afirmou ser necessário “coragem” para “romper esse ciclo vicioso” e “superar diferenças”. "Nossa capacidade de resposta é prejudicada, em particular, pela falta de representatividade que afeta as organizações internacionais”, disse.

“Se os países ricos querem o apoio do mundo em desenvolvimento para o enfrentamento das múltiplas crises do nosso tempo, o Sul Global precisa estar plenamente representado nos principais foros de decisão”, declarou, citando que uma “lógica excludente se reproduz em várias instâncias”.

"Nos fundos verdes, países florestais e megadiversos são obrigados a dividir assentos enquanto os países ricos ocupam cadeiras exclusivas”, destacou Lula.

Ele também citou como exemplo o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial que, quando foram criados, tinham 12 assentos para um universo de 44 países. “Atualmente, são 25 assentos para mais de 190 países. Se mantida a proporção original, essas juntas deveriam ter hoje pelo menos 52 cadeiras”, afirmou.

Essa mudança inclui uma “ampla reforma na ONU” que, de acordo com Lula, “deve estar sempre no centro da governança global”. “A Organização a por uma crise de confiança, que precisa ser restabelecida", apontou.  

Órgãos da ONU

Entre os órgãos da ONU que precisam ser restabelecidos, Lula citou o Conselho Econômico e Social e o Conselho de Segurança. Esse último, segundo o presidente, não tem tido coerência em suas decisões e tem sido paralisado por uma polarização.  Além disso, “tem-se mostrado incapaz de resolver conflitos, e menos ainda de preveni-los".

Lula defendeu que seja eliminado o “caráter fortemente regressivo da arquitetura financeira internacional”. “Países em desenvolvimento enfrentam custos e dificuldades desproporcionais na obtenção de financiamento em comparação com os países ricos. As taxas de juros impostas a países do Sul Global são muito mais altas do que as aplicadas às nações desenvolvidas”, apontou.

O presidente frisou que alguns países em desenvolvimento são afetados de forma severa por um endividamento que tem como consequência o estrangulamento de investimentos em infraestrutura, bem-estar e sustentabilidade.  

“Em 2022, a diferença entre o valor que o mundo em desenvolvimento pagou a credores externos e o que recebeu foi de 49 bilhões de dólares. Há mais dinheiro saindo do que dinheiro entrando”, acusou.

Lula disse que é preciso repensar o sistema comercial internacional e que hoje a Organização Mundial do Comércio (OMC) “encontra-se paralisada devido a interesses geopolíticos e econômicos”.  

“Reverter o novo impulso ao protecionismo, que prejudica desproporcionalmente os países em desenvolvimento, é essencial para garantir um comércio mais equitativo. Essas mudanças terão impacto limitado sem reformas efetivas”, disse.

As críticas de Lula ao funcionamento da ONU vêm sendo repetidas durante a viagem do presidente aos Estados Unidos. O tom desta quarta-feira foi o mesmo adotado na Cúpula do Futuro, no domingo (22), e na abertura da 79ª Assembleia Geral das Nações Unidas, na terça-feira (24).