OPERAÇÃO DA PF

Veja quem são os presos acusados de integrar grupo de extermínio e espionagem que mirava autoridades

Organização é formada por militares da ativa e da reserva, além de civis frequentadores de clubes de tiros. Um deles é dono do canal Frente Ampla Patriótica

Por Renato Alves
Atualizado em 28 de maio de 2025 | 14:05

BRASÍLIA – Sargento reformado do Exército Brasileiro, Gilberto Louzada da Silva é o novo personagem na investigação sobre o assassinato do advogado Roberto Zampieri, conhecido como “lobista dos tribunais”, que levou à descoberta de grupo de espionagem e extermínio.

Mineiro de Nova Lima, Gilberto se apresenta nas redes sociais como consultor de segurança patrimonial e privada, especialista em armas e instrutor de tiro certificado pelo Exército. Além dele, outros quatro homens foram alvos de mandados de prisão nesta quarta-feira (28).

Todos integravam o grupo criminoso Comando C4 (Comando de Caça Comunistas, Corruptos e Criminosos), formado por militares da ativa e da reserva, além de civis frequentadores de clubes de tiros, que cobrava até R$ 250 mil para monitorar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

A organização criminosa também mantinha arsenal de guerra para suas “operações”. Entre eles, fuzis de sniper com silenciador; pistolas com silenciador; lança-rojão tipo AT 34 de ombro; minas magnética e explosivos com detonação remota.

Parte dessas armas foi apreendida nesta quarta em Minas Gerais. A lista de armas está em documentos apreendidos pela PF, que incluem tabela de preços para espionar autoridades e “pessoas comuns”. A espionagem de deputados custava R$ 100 mil. A de senadores, R$ 150 mil.

A PF encontrou papéis escritos à mão com referências a autoridades brasileiras, incluindo congressistas e ministros do Supremo. Ainda não está claro se havia algum crime encomendado contra essas autoridades.

Veja abaixo quem são os cinco investigados e o papel de cada um deles na execução de Zampieri, assassinado com 10 tiros em frente ao escritório em Cuiabá (MT) em 2023. Todos foram presos nesta quarta.

  • Aníbal Manoel Laurindo: fazendeiro, foi indiciado pela Polícia Civil de Mato Grosso como mandante do assassinato de Zampieri. O crime teria sido motivado por uma disputa fundiária envolvendo a Fazenda Lagoa Azul, em Ribeirão Cascalheiras (MT).
  • Antônio Gomes da Silva: indiciado como executor de Zampieri. Confessou e disse ter recebido R$ 40 mil pelo crime. Na execução , ele se apresentou como capelão e usou boina e bengala como disfarce. Foi filmado por câmeras de vigilância.
  • Hedilerson Fialho Martins Barbosa: instrutor de tiro, era dono da pistola 9 milímetros usada no crime e descartada em uma lixeira em uma parada de ônibus em Rondonópolis (MT). Confessou que “indicou” o pistoleiro, mas alegou não ter recebido nada.
  • Etevaldo Caçadini de Vargas: coronel reformado, seria financiador do crime. Elem pagou um sinal de R$ 20 mil pelo assassinato, segundo Antônio. O militar disse em depoimento  que o pistoleiro foi apresentado a ele como pedreiro e negou envolvimento na execução.

Etevaldo Caçadini é dono do canal Frente Ampla Patriótica, criado após os atos de 8 de janeiro de 2023. Segundo ele, o canal no YouTube visa reunir “patriotas e conservadores do Brasil”. Ele publicou 101 vídeos na plataforma, a maioria defendendo golpe de Estado contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), por meio de intervenção militar.

Rodrigo Pacheco estava na mira de grupo de extermínio

O nome do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) está na lista de alvos do grupo descoberto pela PF. Ele presidiu o Senado por quatro anos, até fevereiro de 2025, quando foi alvo de manifestações que pediam intervenção militar e fechamento do Congresso.

“Externo meu repúdio em razão da gravidade que representa à democracia a intimidação a autoridades no Brasil, com a descoberta de um grupo criminoso, conforme investigação da Polícia Federal, que espiona, ameaça e constrange, como se o país fosse uma terra sem leis”, disse Pacheco em nota.

Com base em relatório da PF, o ministro Cristiano Zanin, do STF autorizou a nova fase operação que investiga esquema de venda de sentenças em tribunais estaduais e no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Na 7ª fase da Operação Sisamnes, desencadeada nesta quarta, agentes foram atrás dos mandantes do assassinato de Zampieri. Foi a partir da investigação do assassinato que policiais chegaram ao grupo acusado de negociar compra e venda de sentenças judiciais em diferentes tribunais.

Investigadores também descobriram que os possíveis assassinos do advogado faziam espionagem e atuavam como grupo de extermínio, com pistoleiros profissionais.

Nesta quarta, policiais federais foram às ruas para cumprir cinco mandados de prisão preventiva contra os cinco, além de quatro mandados de monitoramento eletrônico e seis mandados de busca e apreensão no Mato Grosso, São Paulo e Minas Gerais.

Mensagens de advogado morto com 10 tiros sustentam apuração

A investigação sobre a execução de Roberto Zampieri primeiro levou à investigação que resultou no afastamento de cinco desembargadores do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul (TJMS) em outubro de 2024.

A operação que levou ao afastamento dos magistrados foi subsidiada por milhares de mensagens de texto e áudio recuperadas do celular de Zampieri.

O conteúdo do celular do advogado levantou suspeitas de vendas de decisões por gabinetes de quatro ministros do STJ. Este caso é investigado pela PF e está sob sigilo no STF, sob relatoria do ministro Cristiano Zanin.

A investigação do assassinato é objeto de inquérito da Polícia Civil do Mato Grosso, que indica como uma das motivações processos de disputas de terras que tramitam no Tribunal de Justiça estadual.

Os casos de supostas vendas de sentenças no MS e no MT também são investigados no STJ e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ). 

Um dos investigados é Anderson Gonçalves, apontado como o principal lobista de Roberto Zampieri, o advogado assassinado. Peritos da PF identificaram áudios de Gonçalves no celular de Zampieri, em que relata cobranças de pagamentos em aberto ao advogado.

Com base em mensagens encontradas no celular de Zampieri, após a morte dele, os desembargadores Sebastião de Moraes Filho e João Ferreira Filho, de Mato Grosso, foram afastados pelo CNJ em agosto de 2024, também por suspeita de venda de decisões judiciais.

Anderson Gonçalves seria um dos responsáveis por aproximar Roberto Zampieri de desembargadores, tanto em MT quanto em MS, visando decisões favoráveis a clientes do advogado.

Na decisão em que mandou afastar os dois desembargadores do MT, o corregedor nacional do CNJ, ministro Luis Felipe Salomão, também determinou a abertura de investigação sobre reclamações disciplinares contra os dois magistrados, além da quebra de sigilos bancários e fiscal dos investigados e de servidores do Tribunal de Justiça do Mato Grosso, referente aos últimos cinco anos.

Em um dos casos investigados, o CNJ descobriu que os dois desembargadores mantinham uma amizade com Roberto Zampieri e recebiam dinheiro para julgar recursos de acordo com os interesses do advogado. 

Lavagem de dinheiro, extorsão, falsificação, organização criminosa e funcionários fantasmas

A investigação que resultou no afastamento dos cinco desembargadores é um desdobramento da Operação Mineração de Ouro, deflagrada em 8 de junho de 2021, na qual foram apreendidos materiais com indícios da prática dos crimes. 

O inquérito da Mineração de Ouro derivou de telefonemas interceptados na Operação Lama Asfáltica, que apurou a suposta venda de decisões, enriquecimento ilícito, lavagem de dinheiro e contratação de funcionários fantasmas.

  • A Mineração de Ouro investigou o suposto envolvimento de conselheiros do TCE-MS em organização criminosa especializada em fraudes em licitações, superfaturamento de obras e desvio de recursos públicos.
  • Naquele período, foram cumpridos mandados contra os conselheiros Waldir Neves, Osmar Jeronymo e Ronaldo Chadid. Segundo dados da PF, foi apurado esquema de contratação de funcionários fantasmas no TCE-MS e desvio de verbas públicas.
  • Durante os cumprimentos dos mandados, agentes apreenderam R$ 1,6 milhão em endereços ligados aos três conselheiros. Os policiais encontraram ainda 7,2 mil dólares, 4,5 mil euros e 200 libras esterlinas. Ao todo, 20 pessoas são investigadas.

Em 8 de dezembro de 2022, a PF deflagrou a segunda fase da operação, batizada de Terceirização de Ouro. Ela apurou o contrato entre o TCE-MS e a Dataeasy Consultoria e Informática, com sede em Brasília.

Para a investigação, ficou demonstrado que a previsão de pagamentos por meio de Unidades de Serviços Executados (USEs) buscou o superfaturamento e o desvio de recursos públicos, gerando o descontrole da relação contratual.

Nessa fase, foram afastados dos cargos os conselheiros Iran Coelho das Neves, Waldir Neves e Ronaldo Chadid.

Em 10 de julho de 2024, foi deflagrada a terceira fase, denominada Operação Casa de Ouro. Ela foi fruto do aprofundamento das investigações, que tem como objetivo apurar crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

A investigação cita imóvel de alto padrão negociado em 2016 e que teria como dono, de fato, Waldir Neves, apesar de ficar em nome de laranja. Em 2018, a casa foi vendida. 

Segundo a PF, o imóvel foi colocado em nome da empresa do amigo de infância de Neves, Vanderlei Morais, por meio de contrato celebrado com João Nercy Cunha Marques de Souza, naquela ocasião, assessor e funcionário particular do conselheiro. 

Investigadores aram três anos analisando documentos e trocas de mensagens apreendidos e interceptados nas três fases da Operação Mineração de Ouro, até o desencadeamento da ação desta quarta-feira.