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Decisão do STF contra marco temporal deve prevalecer sobre aprovação do Senado
A decisão do STF deverá ser seguida na prática, pois é de conhecimento geral da Justiça brasileira que a tese foi declarada inconstitucional

O projeto de lei aprovado pelo Senado nesta quarta-feira (27) que cria um marco temporal para demarcação de terras indígenas seguiu para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele pode aceitar o texto integralmente, rejeitar alguns itens ou tudo. Seja qual for a definição do Palácio do Planalto, deve prevalecer a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que na semana ada, por 9 votos a 2, rejeitou a tese defendida pela maioria dos parlamentares.
Após a aprovação do Senado, Lula tem 15 dias para sancionar a lei aprovada pelo Senado para que então ela e a vigorar. Por outro lado, o acórdão com a decisão do STF sobre o tema tem até 60 dias para ser publicado no Diário Oficial da União e começar a valer.
Mesmo que Lula sancione integralmente o projeto aprovado pelo Congresso, a decisão da Suprema Corte deverá ser seguida na prática, pois é de conhecimento geral da Justiça brasileira que a tese foi declarada inconstitucional. Esta é a opinião de especialistas em direito. Eles dizem que o Congresso deveria aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para contrapor mais eficazmente o STF, tribunal responsável por resguardar o que decide a Constituição. A proposta aprovada no Senado é um projeto de lei, que não muda o texto constitucional.
Nesta quarta, no mesmo tempo que o Senado votava o projeto a toque de caixa, o STF se reunia para definir os critérios que encerraram o julgamento sobre o tema. A maioria dos ministros concordou em criar um mecanismo de indenização a fazendeiros que terão de deixar as terras por causa da demarcação de território indígena.
Mas, diante da insistência do Congresso em levar o marco temporal adiante e confrontar a decisão do Supremo, deve haver judicialização do tema. Como o projeto foi aprovado depois e como uma lei comum, partidos políticos poderão contestá-lo por ser inconstitucional e provocar o tribunal a debater novamente o marco temporal.
A decisão do STF o marco temporal também poderá balizar a atuação do Poder Executivo na demarcação. Há 226 processos aguardando um desfecho do caso, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça.
Indígenas lembram que foram expulsos pelos portugueses e militares
O marco temporal é uma tese segundo a qual só podem ser demarcadas terras já ocupadas pelos indígenas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Essa tese deriva de uma interpretação – considerada equivocada pelo STF – do artigo 231 da Constituição. Por ela, mesmo que tenham sido expulsos das suas terras, como acontece desde a chegada dos portugueses, os indígenas não teriam direito a ocupar um espaço que originalmente era deles.
Além do fato de terem sidos expulsos e quase dizimados ao longo da história do Brasil, os indígenas são contrários ao marco legal porque alguns povos são nômades e podem estar ligados a uma terra, mesmo não a habitando em uma data específica, inclusive podem voltar reocupá-la por um determinado período. Eles lembram que, durante a ditadura militar (1964-1985), muitos povos foram tirados à força de suas terras. Ou seja, não estavam ali antes de 1988 por uma opção. Ainda há as constantes invasões de suas terras por garimpeiros e fazendeiros.
Os indígenas e especialistas também rechaçam o texto aprovado pelo Congresso porque, além da criação de uma data para demarcação das reservas, libera, entre outras coisas, a exploração econômica das terras indígenas, inclusive com extração de minérios. Também permite o contato com povos isolados, o que, segundo indigenistas, seria uma tragédia, com extermínio de comunidades inteiras.
Alcance do projeto do marco temporal vai muito além da data da constituição
O projeto de lei aprovado pelo Senado nesta quarta que cria um marco temporal para demarcação de terras indígenas vai muito além de usar o 5 de outubro de 1988 como data limite.
O projeto, que foi relatado pelo senador Marcos Rogério (PL-RO) e aprovado em regime de urgência — matéria foi aprovada de manhã pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e enviada à tarde para votação no Plenário, onde teve 43 votos a favor e 21 contrários — e agora segue para a sanção de Lula, libera a exploração econômica das terras indígenas, inclusive com extração de minérios.
Mais: o relatório aprovado pelos senadores também prevê uma flexibilização da política de não contato dos povos indígenas isolados, permitindo que entidades privadas tenham contato com esses povos para viabilizar ações consideradas de “utilidade pública”.
Ou seja, o projeto de lei atende a setores com forte representatividade no Congresso, como os ruralistas, maiores interessados na criação do marco temporal. Também são totalmente favoráveis à tese os garimpeiros, justamente porque será permitida a extração de ouro, diamantes e outros minerais nas terras indígenas.
Confira o que o projeto do marco temporal aprovado na quarta permite:
- autorização para garimpos e plantação de alimentos transgênicos em terras indígenas;
- contato com povos isolados, o que, segundo indigenistas, pode levar à extinção de etnias;
- realização de empreendimentos econômicos sem que os povos afetados sejam consultados;
- celebração de contratos, entre indígenas e não-indígenas, para exploração de atividades econômicas nos territórios tradicionais;
- que o governo pode tomar a terra ou destiná-la ao Programa Nacional de Reforma Agrária se houver “alteração dos traços culturais” ou se for verificado que a área não é mais “essencial” à comunidade indígena;
- interrupção da posse indígena ocorrida antes de outubro de 1988, independentemente da causa, inviabiliza o reconhecimento da área como tradicionalmente ocupada. A exceção é para caso de conflito de posse no período. Neste caso, o marco temporal não seria aplicado em caso de expulsão dos indígenas. Especialistas avaliam, no entanto, que é difícil comprovar o conflito e a expulsão;
- indenização daquelas que invadiram terras indígenas antes da lei e validação de títulos de propriedade em terras das comunidades indígenas.