Crise

Insistência do governo em pôr fim à desoneração incomoda até a base fiel de Lula

A preocupação maior é no cenário eleitoral deste ano, já que o aumento da alíquota das prefeituras e a consequente baixa nos caixas públicos pode influenciar votos

Por Lucyenne Landim
Publicado em 04 de abril de 2024 | 13:54

A insistência da equipe econômica do governo federal em querer acabar com a desoneração da folha de pagamento, especialmente de municípios, tem gerado desconforto até na base fiel do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A avaliação é de que o ganho fiscal que se tem com o fim do incentivo não compensa os efeitos desastrosos em termos políticos e eleitorais. O incômodo tem sido maior em quadros que disputarão cargos nas eleições deste ano e vão precisar explicar, na campanha, o apoio a um governo que complicou o caixa das cidades. 

Outro grupo que não está ao lado de Lula nesse caso é o que compõe o Centrão, que ganhou cargos no segundo semestre do ano ado em troca de garantir votos ao petista. O entendimento fixo desses parlamentares, no entanto, não é surpresa, já que eles consideram que não é possível apoiar temas que custam caro nas bases eleitorais.  

Ainda assim, questionam se o governo Lula não tem feito o cálculo do cenário eleitoral que se impõe, especialmente porque avalia judicializar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). Na tentativa de amenizar a crise, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, é um dos poucos com tom moderado. Ele declarou na quarta-feira (3) que o governo “está buscando um meio-termo”, atendendo ao “pleito justo dos prefeitos, mas também para manter o equilíbrio fiscal e previdenciário”. 

Na queda de braço entre o governo e o Congresso, a desoneração até 2027 foi aprovada em outubro, mas vetada por Lula em novembro. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, justificou o impacto fiscal sem compensação. O fim do incentivo representa uma injeção de R$ 10 bilhões nos cofres públicos. Deputados e senadores, então, derrubaram o veto, e o governo voltou a reonerar por meio de uma Medida Provisória (MP). A via tem aplicação imediata, mas precisa ser aprovada pelos parlamentares em até 120 dias.  

O acordo era que, nesse prazo, fosse construído um texto de consenso, o que não foi feito. Enquanto isso, Lula revogou, em fevereiro deste ano, a reoneração gradual aos setores da economia que mais empregam. O problema foi que essa decisão não contemplou os municípios, que ficariam com a tributação mais alta a partir dessa semana.

Com isso, o presidente do Congresso Nacional e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), manteve a desoneração para cidades de até 156 mil habitantes em uma canetada na última segunda-feira (1º). A decisão foi a mesma que revogou parte da MP que retomava a cobrança do imposto de 20%, e não a alíquota de contribuição previdenciária reduzida a 8%.

Pacheco tem dito, repetidas vezes, que não cabe ao governo derrubar uma decisão tomada por meio do voto do Congresso. Além disso, se o debate for retomado por um projeto de lei, a tendência é que o governo saia derrotado e a desoneração seja regulamentada. 

Mais contido sobre o assunto, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já declarou que “conquistas”, citando a desoneração, não podem retroceder. A pergunta principal que se faz nos bastidores é se vale a pena ao governo bancar essa insistência da equipe econômica por R$ 10 bilhões a mais no caixa, valor considerado negociável para que se garanta uma base mobilizada e possível de articulação em outras frentes.

Outro argumento do governo é o de recuperar receitas para cumprir a meta de Haddad de zerar o déficit (diferença entre receitas e despesas) nas contas públicas neste ano. A meta foi considerada ousada por muitos, mas aprovada pelo Congresso Nacional como uma espécie de teste de Haddad. Por isso, a defesa é que o próprio ministro assuma o “problema” de aumentar a arrecadação, mas sem impor sacrifícios impopulares. A conta tem caído até para quem comanda a articulação política do governo. 

A briga piora, ainda, porque há uma mobilização de prefeitos em Brasília contra a posição do governo de acabar com a desoneração. O discurso que esses gestores levam às cidades que comandam pode influenciar decisões nas eleições municipais de outubro. A Confederação Nacional de Municípios (CNM) tem patrocinado campanhas enfáticas para que as cidades paguem uma alíquota menor.