BRASÍLIA – A defesa de Jair Bolsonaro (PL) vai tentar tirar o processo sobre a suposta tentativa de golpe de Estado da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) e levá-lo ao plenário. Na última terça-feira (18), o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, apresentou a denúncia contra o ex-presidente e outras 33 pessoas.
A Primeira Turma é formada pelos ministros Alexandre de Moraes (relator da ação), Cristiano Zanin, Carmen Lúcia, Luiz Fux e Flávio Dino. Com esses nomes, os advogados do ex-presidente acreditam que a tendência é uma condenação unânime. Já no plenário, formado pelos 11 integrantes da Corte, ele teria votos favoráveis.
O STF tem dois ministros indicados por Bolsonaro: Nunes Marques e André Mendonça. Além de contar com os votos de ambos, a defesa do ex-presidente aposta que com todos os ministros participando do julgamento haveria muitos argumentos contrários à denúncia da PGR e alegações de Moraes.
Ainda, o caso poderia se arrastar por mais tempo, pois haveria mais ministros apresentando suas ponderações e até possíveis pedidos de vista – mais tempo para análise do processo.
Confira os próximos os da ação sobre a tentativa de golpe:
Em sua denúncia ao STF, Paulo Gonet narrou uma série de eventos que resultaram na suposta tentativa de golpe de Estado, tendo como ponto alto os atos de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e vandalizadas por apoiadores de Jair Bolsonaro pedindo intervenção militar contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que havia tomado posse uma semana antes.
Na acusação, Gonet ressalta que a abolição do Estado democrático não precisa se consumar para ser crime. Lembra que os cinco crimes atribuídos a Bolsonaro e outros estão previstos nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal. A descrição dos dois tipos penais começa pelo verbo “tentar”. Todos os 34 denunciados na terça são acusados de cometer os seguintes crimes:
Caso a acusação seja aceita e resulte em condenação, as penas somadas podem chegar a 38 anos de prisão.
Na denúncia de 272 páginas, Gonet falou em “iter criminis”. Este é um termo do direito penal que significa caminho para crime e se refere ao processo de evolução do delito, ou seja, descrevendo as etapas que se sucederam desde o momento em que surgiu a ideia até a sua consumação.
Para sustentar a acusação, o chefe do Ministério Público, além de citar documentos produzidos pelos próprios acusados, como os supostos planos de golpes que incluíram assassinatos de Lula e do ministro Alexandre de Moraes, recorda uma série de episódios, que vão dos constantes ataques às urnas e ao STF, antes das eleições, aos atos violentos após a derrota de Bolsonaro nas urnas.
Veja a seguir a cronologia desses eventos, descritos na denúncia da PGR:
As acusações da PGR estão baseadas no inquérito da Polícia Federal (PF) que indiciou, em novembro, 40 pessoas em uma suposta trama golpista para impedir a posse de Lula.
No entanto, na terça-feira, Gonet apresentou denúncia contra 34 pessoas, incluindo Bolsonaro. Ele deixou de fora 10 indiciados pela PF. Por outro lado, incluiu quatro pessoas não citadas anteriormente.
Um dos elementos da investigação da PF foi a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. Ele disse que foi o ex-presidente quem pediu o monitoramento de Alexandre de Moraes.
A informação consta na denúncia enviada ao STF nesta terça por Paulo Gonet. Nela, Bolsonaro é apontado como líder de uma organização criminosa “baseada em projeto autoritário de poder” e “com forte influência de setores militares”.
Segundo a PGR, Cid confirmou que Moraes estava sendo monitorado e afirmou que, inicialmente, os pedidos vinham dos “kids pretos” Rafael Martins de Oliveira e Hélio Ferreira Lima. Ambos foram denunciados por estarem à frente da Operação Copa 2022, que visava o assassinato de Moraes.
Ainda de acordo com a delação, foi Mauro Cid quem pediu a Marcelo Câmara, ex-assessor de Bolsonaro, para fazer o monitoramento. O tenente-coronel falou em “relevante contribuição” do ex-assessor para as ações violentas.
A Operação Copa 2022 tinha o intuito de criar uma comoção social capaz de arrastar o Alto Comando do Exército para o golpe de Estado, ainda segundo a denúncia da PGR. Em execução inicial da operação, foram levadas a cabo ações de monitoramento dos alvos de “neutralização”, que seriam Moraes e Lula.
O plano itia uso de explosivos, fuzis e envenenamento, conforme investigação da PF. “No dia 15 de dezembro de 2022, os operadores do plano, com todos os preparativos completos, somente não ultimaram o combinado, por não haverem conseguido, na última hora, cooptar o Comandante do Exército”, diz Gonet.
Na parte sobre Bolsonaro, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou que o ex-presidente e o general Braga Netto, ex-ministro e vice na chapa com Bolsonaro em 2022, exerceram papel de liderança para realização de uma “trama conspiratória armada e executada contra as instituições democráticas”.
“A organização tinha por líderes o próprio presidente da República e o seu candidato a vice-presidente, o general Braga Neto. Ambos aceitaram, estimularam, e realizaram atos tipificados na legislação penal de atentado contra o bem jurídico da existência e Independência dos poderes e do Estado de Direito democrático”, afirmou Gonet.
O PGR diz ainda que a denúncia contra Bolsonaro narra os fatos cometidos por uma “organização criminosa estruturada” para impedir a concretização da vontade popular demonstrada com o resultado das eleições de 2022, quando Lula foi eleito presidente.
“O presidente da República [Bolsonaro] adotou crescente tom de ruptura com a normalidade institucional nos seus repetidos pronunciamentos públicos em que se mostrava descontente com decisões de tribunais superiores e com o sistema eleitoral eletrônico em vigor. Essa escalada ganhou impulso mais notável quando Luiz Inácio Lula da Silva, visto como o mais forte contendor na disputa eleitoral de 2022, tornou-se elegível, em virtude da anulação de condenações criminais”, afirmou Gonet.
A defesa de Bolsonaro divulgou uma nota na noite de terça-feira, logo após a apresentação da denúncia da PGR ao STF. Os advogados do ex-presidente afirmam que não há provas que o conectem à trama golpista.
Um dos argumentos da defesa é que, mesmo após a apreensão dos telefones do ex-presidente, não foram encontradas mensagens sobre o plano de golpe.
“A despeito dos quase dois anos de investigações – período em que foi alvo de exaustivas diligências investigatórias, amplamente adas por medidas cautelares de cunho invasivo, contemplando, inclusive, a custódia preventiva de apoiadores próximos –, nenhum elemento que conectasse minimamente o presidente à narrativa construída na denúncia, foi encontrado”, diz a manifestação.
Os advogados de Bolsonaro afirmam também que a denúncia é baseada no acordo de colaboração do tenente-coronel Mauro Cid, seu ex-ajudante de ordens. A delação é classificada pela defesa do ex-presidente como “fantasiosa”.
“O presidente Jair Bolsonaro confia na Justiça e, portanto, acredita que essa denúncia não prevalecerá por sua precariedade, incoerência e ausência de fatos verídicos que a sustentem perante o Judiciário.”